sociedade tramagalense

POR ANA PAREDES MENDES - Licenciada em Sociologia do Trabalho e investigadora de História Local

A mudança de costumes é o único meio de que dispomos para nos mantermos vivos e rejuvenescermos. E esse o objetivo da mudança de ares e do lugar da viagem de recreio.”

                                                                                           Thomas Mann

PREÂMBULO

O mundo, material e simbólico está profundamente marcado pela ação dos homens. A análise sociológica investiga os diversos modos como as ações dos homens são condicionadas por relações estabelecidas ao nível dos grupos e organizações em que se inserem1. Por isso mesmo, esqueçamos as ruas alcatroadas e recordemos o chão de terra e o pó que fica no ar quando os antigos carros passavam. Absorvamo-nos assim, em tempos que já lá vão, em costumes e hábitos que foram e que se perderam, mas que aqui, no mundo rural, esperamos que possam emergir um dia. A História esbate, de forma gradativa, o acessório e apenas retém uma fração do que é essencial, muitas vezes, desenraizado do tempo e das circunstâncias. Esta história, talvez já alguns a tenham ouvido, mas tentarei, por recurso ao vocábulo e pela invocação à lembrança, fazer com que o leitor se envolva novamente num passado, que não é assim tão distante.

HISTÓRIA DA S.A.T - A FILARMÓNICA

Retrocedamos até julho de 1901, ano em que nasceu aquela que hoje conhecemos como Sociedade Artística Tramagalense, então com a designação de “União Fabril”.

O pilar basilar desta coletividade foi a banda filarmónica mas deve-se a honra ao benfeitor Eduardo Duarte Ferreira. Reza a história que no dia um de maio de 1901, António Cordeiro, Álvaro Manana e José Rodrigues Ferreira Calado, saíram à rua tocando o hino alusivo ao Dia do Trabalhador. Em jeito de camaradagem, outros operários da fábrica Duarte Ferreira juntaram-se aos colegas e, estando a iniciar o seu dia de trabalho, lembraram-se de solicitar a Eduardo Duarte Ferreira que considerasse o dia feriado, bem como a criação de uma banda de música. A partir de então, nesta vila de origem operária e neste dia, foi sempre considerado feriado, com o objetivo de confraternização da grande família dos trabalhadores Tramagalenses.

Foram adquiridos alguns instrumentos usados, mas que, para a iniciação musical de alguns elementos, serviam na perfeição. Somente em 1904, novos instrumentos seriam adquiridos, por meio de peditório entre as pessoas mais abastadas da freguesia, tendo, é claro, Eduardo Duarte Ferreira, contribuído com a parte mais volumosa. Duarte Ferreira teve, desde o início, um papel preponderante: mandou fazer o mobiliário, pagou durante algum tempo as despesas da luz bem como metade do ordenado do regente da banda. Como não havia sede própria nesta altura, os ensaios realizavam-se numa sala da fundição e ninguém faltava aos ensaios2. “O Grémio chegou a ter uma banda e uma orquestra porque havia elementos que tocavam nas duas (...) a orquestra tocava nos bailes e a banda era mais para os concertos no coreto, para aquelas festas... e saía aqui para os arredores, para Rio de Moinhos, Abrantes, Sardoal... (..)3. De entre os muitos regentes da S.A.T. destacam-se os nomes de José Vicente de Sousa Nogueira e Amadeu de Almeida Horta.

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Em janeiro de 1902, realizou-se a primeira atuação pública da filarmónica, tocando “Os reis”. Seguiram-se outras atuações, no dia 1º de maio do mesmo ano, em Agosto onde abrilhantaram a tradicional Festa de Nossa Senhora da Oliveira e, pelo Natal, onde tocaram na Missa do Galo. Em 13 de Junho de 1906, a banda toca fora da nossa terra4, tornando-se aos poucos uma das melhores bandas do concelho de Abrantes.

Com alguns “altos e baixos” no seu percurso, em 1916 a coletividade foi reorganizada, tendo então adotado o nome de “Grémio Musical Tramagalense”5.

De acordo com o regulamento do Grémio, datado de 16 de outubro de 1930, este tinha como fins:

A Instrução e o Recreio6,

Aulas de música, biblioteca,

Concertos musicais, jogos, bailes, receitas.

FARDAMENTO E EMBLEMA

Segundo os Estatutos de 1947, a S.A.T. adota como emblema a lira e tem como divisa principal “Instrução e Recreio”7.

No dia Io de maio de 1903, estreava-se o primeiro fardamento de boa fazenda azul, em que metade do importe foi pago por Eduardo Duarte Ferreira e o restante pelas pessoas da terra que tinham mais posses.

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O segundo fardamento foi adquirido pela coletividade em 1935, já tendo sido estreado um outro, em cotim em 1926.0 terceiro fardamento de fazenda azul foi oferecido pela MDF em 1950. Inaugurava-se também o primeiro estandarte, oferecido por Manuel Vicente de Jesus, em seda e bordado a ouro, por sua filha, Elvira8.

ACTIVIDADES DA COLECTIVIDADE

Como a coletividade não se justapunha apenas à banda filarmónica, por volta de 1903 tiveram início as atividades teatrais9, com a vinda para o Tramagal do pároco Manuel Brás da Rosa. As representações, por sua vez, eram ocasionais e muito restritas. Começaram a fazer-se alguns espetáculos numa divisão destinada a dormitório, para o pessoal agrícola, que algumas vezes chegava à terra.

Algum tempo depois, os espetáculos começaram a realizar-se numa dependência da Metalúrgica Duarte Ferreira, tendo-se representado algumas peças relevantes, como por exemplo “Jocelim, o pescador de baleias”, “João, o corta mar”, “Erro Judicial”, comédias como “O descasca milho”, “A arte de montes”, operetas de sucesso tais como “O moleiro de Alcalá” e “Entre duas avés marias”.

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Peças de Teatro na S A.T

Anos depois, foi criado um palco num lagar de azeite ou vinho, onde ainda havia uma mó10. Do lado sul, havia um anexo, isolado que servia de palheiro ou de arrecadação. Mais tarde, integrado no Grémio Musical Tramagalense, o agrupamento liberalizou-se e passou a incluir operários e empregados da fábrica Duarte Ferreira, altura de alguma expansão sem, no entanto, alcançar o esplendor merecido devido ao isolamento em que a localidade se encontrava por falta de vias de comunicação.

Em 1944, com Amadeu Almeida Horta como regente da banda de música e diretor do grupo cénico, foram trazidas inovações para o teatro, onde se representaram peças de grande valor artístico e musical. Destacam-se, entre outras, as peças “Duas causas”, “Jogo da Rosa” e “A Bruxa”11. Ensaiaram também nessa altura, o Sr. José Salgueiro, bem como Manuel Simplício, Jerónimo de Oliveira e o Eng.° Bernardes Silva. O Sr. José Salgueiro encenou “Na terra do pão de milho” (1933), revista que fez muito sucesso na década de 30, visto que se tratava de uma caracterização dos habitantes da vila Tramagalense.

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Cartazes das peças "Amor de Cigana” (1935) e “A Bruxa” (1949)

O Sr. Manuel Quirino Manana,12 de 90 anos, recorda com nostalgia esta revista. Contou que várias pessoas da vila foram retratadas na peça, os vendedores da praça (ainda esta era no largo perto da Igreja), o coveiro, até a Empresa Elétrica do Tramagal, Lda! Confessou que um dos momentos de que mais se recorda da peça, foi quando um antigo trabalhador da fábrica Duarte Ferreira, andava a ‘fazer frente’13 a uma menina, filha do Sr. José Dias Pinheiro. Certa vez, o pai da rapariga terá dito “Hás-de vê-la por um óculo”! Dizem que, o rapaz, como tinha ideia na moça, comprou um óculo e assim apareceu junto da casa da rapariga! Também isto foi representado na revista! Imaginem o sucesso...

No ano de 1968, a atividade teatral estava parada. Como é normal nestas estórias, um grupo de amigos que já tinha feito teatro, criou uma comissão, formada por Joaquim Mateus, Fernando Grácio, Francisco Branco, Jacinto Diogo e Joaquim Agostinho, com vista a retomar a atividade teatral. Desde essa data, as comissões, têm tido um papel considerável no grupo, sendo constituídas por elementos do mesmo, somente com a boa vontade de ajudar o teatro da S.A.T.

A partir dessa data, foram vários os encenadores do grupo cénico da S.A.T., Jacinto Diogo Grácio, que encenou entre outras: “A Promessa” de Bernardo Santareno, “A Bruxa”, “Amor de Cigana” e a revista à portuguesa “A Trapaceira”, focando alguns problemas relacionados com o mau momento vivido no Tramagal na altura e que alcançou grande êxito, não só na S.A.T. como noutras localidades da região.

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Panfletos publicitários de espetáculo de variedades e do filme “O Costa do Castelo”.

De 1980 a 1982 Luís Contente Moreira encenou o grupo com as peças “O Tio Simplício”, “A pérola das sogras” (comédia) e “O Perdão dos Filhos” (drama).

Em 1984, Jacinto Diogo volta às encenações e foi posta em cena “O Gato”, de Henrique Santana. Este sai passado pouco tempo, por motivos de saúde. Passaram então a encenar o grupo cénico Fernando Grácio e Joaquim Agostinho, ainda com a peça “O Gato”, com deslocações para fora da vila Tramagalense através do INATEL14. De entre as peças mais recentes do Grupo Cénico, podemos destacar “As mãos de Abraão Zacuto”15, “É urgente o Amor”, “A Partilha” e “A Encenação”16. Segundo conversa informal com o Sr. José Joaquim Oliveira17, presentemente ensaiam o Grupo Cénico, os Sr. Joaquim Agostinho e Francisco Branco.

A S.A.T. era conhecida também pelas suas exibições de cinema e televisão. No Verão, o cinema era feito na esplanada e no Inverno, na sede. "(...) Antigamente quando veio a televisão em 57/58, estava eu na direção, comprámos a primeira televisão para a Sociedade porque só havia televisão na taberna onde era ‘O Cinco’. Levávamos o aparelho todos os dias cá da sede para a esplanada. Aquilo enchia-se, faz de conta que era o cinema. As pessoas aderiam porque não havia outras coisas, não havia televisão em casa (...)”.

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Cartaz de baile e desfile de vestidos de chita.

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Vencedores do Concurso de Trajes e Marcha, na década de 40.

Conta o Sr. João Manito que, por volta de 1940, chegou a haver exibição de filmes duas vezes por semana, “(..) vinham uns indivíduos da Moita do Norte e a Pátria Filmes de Lisboa. No tempo da guerra, não havia gasolina, eles despachavam as bobines e a máquina de passar os filmes no comboio e eu e um primo meu íamos com a carroça à estação buscar os apetrechos e íamos pôr à Sociedade e depois do filme acabar, por volta das onze e tal da noite, o funcionário arrumava tudo, punha na carroça e íamos pôr na estação para ir no comboio para Lisboa. ”

Ganhavam com isso, dois bilhetes permanentes de borla para o cinema... e mais amor à camisola... Depois de uma denúncia, a exibição de cinema foi proibida na S.A.T., “(...) se houvesse cinema ia tudo para a cadeia-isto na década de cinquenta (...)”.18

Durante muitos anos, pelos Santos Populares e pelo Carnaval, a S.A.T. manteve as tradicionais marchas populares. Em 1955, num período em que as marchas estavam a enfraquecer,

resolveram organizar uma marcha só para casados, pelo que se seguiu posteriormente a Marcha dos Solteiros e a Marcha dos Noivos! De salientar que, durante algum tempo, se fizeram também concursos de trajes onde “(...) cada um se vestia como quisesse C..)”19.

Outras atividades realizadas na S.A.T, ao longo dos anos, passam também pela sua disponibilidade para ceder o espaço a outras associações. É importante referir que, os Concursos da Voz d’Ouro e Vestido de Chita eram organizados pela Comissão Unitária de Mulheres - C.U.M.20", um movimento de mulheres, politicamente de esquerda, sem fins lucrativos. O seu único objetivo era angariar fundos para a construção de um Lar de Idosos, algo que nunca veio a acontecer. Estes concursos voltaram a realizar-se novamente em finais dos anos oitenta, pela mão de outras Associações, nomeadamente pela Associação de Melhoramentos.

 

O CORETO

No ano de 1922, devido à franca expansão do Grémio, na direção de Joaquim e Eduardo C. Duarte Ferreira, filhos do distinto fundador da Metalúrgica Duarte Ferreira, foi construído, a despesas da coletividade e por alguns grados da terra, um coreto que, independentemente da filarmónica, manteve ainda durante anos, uma excelente orquestra de instrumentos de corda, composta por cerca de 30 elementos.21 Apesar de construído num local público, o coreto era propriedade do Grémio. “A banda ia tocar ao coreto, mas a Tuna22 não punha lá os pés”, revelou em tom de gracejo o Sr. João Manito23, de 82 anos. Quando a Tuna fazia alguma festa, faziam um coreto de madeira para tocar no mesmo local, no Ribeiro Seco, agora Largo dos Combatentes.

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Coreto de Tramagal e a respetiva planta

Consta que o coreto foi demolido devido às rivalidades existentes entre os membros da S.A.T. e da Tuna, “(...) o pessoal do teatro tinha aquilo engasgado e então eles fizeram aquela 'rampa de lançamento’ (...)”. Na altura, o Presidente da Assembleia-geral24 era o Sr. Eugênio Subtil, tendo sido chamado ao Sr. Mário Basto para receber uma ordem de que o coreto iria ser desmantelado. Foram feitas duas Assembleias-gerais para discutir o assunto, tendo a primeira acabado à meia-noite e recomeçado dias depois. Na sessão seguinte, o Sr. Mário Basto, apresentou diplomaticamente as razões que justificavam o desmantelamento do coreto, referindo até que poderia ser edificado noutro local do Tramagal25. Depois disso, mais ninguém disse nada, " (...) como o Sr. Mário Basto era o Diretor da Metalúrgica estava tudo sujeito à disciplina da época (..)”. Um grupo de rapazes manifestaram-se contra a demolição do coreto entre os quais José Moreira, Marçalo Maximiano, Francisco Diogo, Manuel Agostinho, Jacob da Silva Ferreira, José Neves Branco, Tomé Diogo, Joaquim da Silva Pereira, João Manito, entre outros. “(..) Eles diziam que queriam demolir o coreto para arranjar o largo, mas a gente sabia porque é que eles queriam... era porque era da S.A. T. e eles não o queriam lá (...)”. E o coreto foi demolido em 1961...

Em 1944, por disposições oficiais, o Grémio passou a adotar o nome de Sociedade Artística Tramagalense. “Na época, devido ao fascismo, houve a mudança de nome porque foi proibida a existência de Grémios”26. A S.A.T. tinha assim, como fins cultivar a música, dirigir, regulamentar e difundir o recreio e solidariedade nas suas diversas facetas, bem como a educação e instrução; promover o estreitamento de relações entre os associados e a educação moral da população associativa; organizar, manter e desenvolver uma biblioteca27, bem como levar a efeito récitas, festas desportivas, concertos musicais, sessões solenes e cinematográficas, conferências educativas, bailes, saraus, quermesses, jogos autorizados por Lei e aulas de música.

RIVALIDADES SAUDÁVEIS

Muitos eram aqueles que não iam à Tuna, considerada um local “para os ricos”. Muitos até nunca entraram no edifício do Teatro Tramagalense, pelos motivos que anteriormente foram referidos.

O Sr. Manuel Quirino Manana esclareceu-me que, em 1955, num dos anos em que pertenceu à direção, esta encontrava-se em contacto com o Rancho do Pego para os trazer a Tramagal, o que não aconteceu por questões monetárias. O Teatro logo se prontificou e contratou o Rancho para atuar nas suas instalações. Por conhecimento e intermédio de um dos membros da S.A.T., resolveram trazer o Conjunto José da Silva, do Barreiro, para atuar nessa mesma noite. Foi um sucesso! O conjunto José da Silva animou o baile da S.A.T., enquanto que o Rancho do Pego ‘desanimou’ os presentes na Tuna. Reza a história que este Conjunto trouxe uma inovação: quando o público batia palmas no final de cada atuação, o conjunto voltava a tocar, isto é, trouxeram o chamado bis!28. O público aderiu tanto que houve baile até às 6 horas da madrugada!

A CONSTRUÇÃO DA SEDE

O espaço existente para o funcionamento da coletividade era escasso e, em 1947, a direção teve como principal objetivo dar continuidade ao que vinha sendo o sonho da coletividade, que era a construção da sede. “Todo o espaço da Sociedade era do padre Mota e depois eles alugaram aquilo, o palheiro. Aquilo era uma casa grande, já no meu tempo a sede do Grémio era lá. Mais tarde, isto já é uma história mais recente, a Sociedade comprou um terreno ao Sr. Torres Pereira, que é onde estão instalados os Correios e a sede do Sindicato. A Sociedade comprou esse terreno para fazer aí uma sede porque aquilo era arrendado. Aquilo à frente tinha uma casa que foi residência de padres, de médicos, onde hoje já não tem nada. Por isso a sede da Sociedade era atrás dessa casa e aquilo depois tinha uma quinta que era do padre Mota. Depois a Sociedade comprou o terreno ao Sr. Torres Pereira, ao lado da escola dos rapazes. Entretanto, foi feito o Teatro e fizeram a sede do Teatro. E quando se pensava em fazer a sede do Grémio, onde hoje estão os correios (risos), a Junta de Freguesia de Tramagal, de que era Presidente o Sr. Joaquim Daniel (que era o ‘manda-chuva ’ lá da terra, que foi quem fez este desenho29... isso é que é o mais importante, é que ele era desenhador!) resolveram fazer uma rua aqui do ‘muro do barulho ’ a sair ao Sindicato (...) porque antigamente, por causa da MDF, não é, já se falava numa variante à estrada nacional 118. Foi projetada uma rua que cortava o terreno da Sociedade ao meio. Já havia uma planta feita e tudo, pronto para começar o edifício. (...) A Sociedade ficou com os pés e as mãos atadas porque a rua foi projetada mesmo para isso, para impedir que se fizesse lá a sede (...) Os herdeiros do Mota venderam a quinta e a Sociedade comprou com o aval da Metalúrgica. A Metalúrgica ficou com o terreno por troca - que o terreno custou cento e não sei quantos contos e depois a Sociedade ficou a pagar renda. Comprou-se aquilo aos donos, fez-se a sede para o dia-a-dia na casa da frente, isso é que tinha uma sala de bilhar, a direção, uma biblioteca, tinha casas-de-banho e a parte de trás é o que é agora. Depois fez-se uma esplanada e um ringue para o futebol.30

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Obras de construção da sede da Sociedade Artística Tramagalense

Aquando da construção da sede, fez-se apelo à população local - aos sócios e a outras entidades, que contribuíram com algum dinheiro, madeiras, carros para transporte entre outros materiais. A construção de janelas, portas, portões, palco foram concluídos pelos sócios nas horas vagas.

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Minibanda da S A.T, em Março de 2008, em atuação na Festa do Vinho

É de salientar a boa vontade das pessoas e dos sócios, que sempre foi feita gratuitamente. Começadas as obras, é de mencionar que somente a escritura principal foi feita por pessoal contratado. Com o novo edifício poderiam desenvolver e trazer mais animação e desenvolvimento de atividades culturais e recreativas a uma vila que viveu períodos difíceis. Em 1990 foram legalizados todos os terrenos e edifícios para o nome da coletividade, que anteriormente vigoravam em nome da MDF. “(..) a MDF ajudou muito na construção daquilo, as estruturas metálicas e outras coisas, a Sociedade foi feita à custa do trabalho dos sócios que saíam do trabalho e iam carregar camionetas de areia e de pedra. Quando a sede foi feita, a MDF ajudava porque, na altura, as empresas que tinham tantos funcionários eram obrigadas a ter um centro de recreio (..)31. A MDF nunca teve esses ‘centros de recreio’ porque se baseava nessa prática, subsidiando as duas coletividades existentes, o Teatro Tramagalense e a Sociedade Artística Tramagalense.

ÚLTIMOS TEMPOS

A Sociedade Artística Tramagalense é possuidora da Medalha de Ouro, com que foi agraciada pela Federação Portuguesa das Coletividades de Cultura e Recreio, federada n° 331 desde 9/07/1948.

Presentemente, a coletividade desfruta de vários grupos entre os quais, o Grupo Cénico (1903), Grupo de Cantares Populares “O Rouxinol” (1992), Grupo Coral (1994), para além de desenvolver ainda torneios de futebol de salão entre outras atividades destinadas ao convívio da população, nomeadamente em dias festivos32.

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Alguns dos nomes que marcaram a História da S A.T

POSTSCRIPTUM

Concluímos por aqui, sem desfecho definitivo. Não que não haja lembrança nem que se tenha estagnado o assunto. Sim, ainda há muito para contar, mas muito também já se perdeu e esqueceu... O tempo altera tradições e aquilo que antigamente foi, hoje já não é. Resta-nos a lembrança e a determinação de trazer até aos nossos dias o calor, a animação e o regozijo que, em tempos, distinguiu o nosso Tramagal. Cabe, agora, a todos os que não viveram estes tempos, recolher estas memórias e “plantar” o que resta delas às gerações que se seguem. Afinal, somos sempre um reflexo dos nossos antepassados e... sabe bem sentir esta memória tão perto...

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BIBLIOGRAFIA

-ACTAS, Livro de Atas, Sociedade Artística Tramagalense, 1992.

-Estatutos da Sociedade Artística Tramagalense, 1945.

-Estatutos do Grémio Musical Tramagalense, 1930 Estatutos do Grupo Cénico da Sociedade Artística Tramagalense, 1986.

-PAIS, José Machado, “Sociologia da Vida Quotidiana: teorias, métodos e estudos de caso”, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 3a Edição, 2007.

-SILVA, Augusto Santos, PINTO, José Madureira (org), “Metodologia das Ciências Sociais”, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento, 14a Edição, 2007.

-Sociedade Artística Tramagalense, “100 anos com muita História”, Edição Sociedade Artística Tramagalense, 2001.

-TERMOS DE POSSE, Livro de Termos de Posse, Sociedade Artística Tramagalense, 1945.

NOTAS FINAIS

Fotografias gentilmente cedidas pela Sociedade Artística Tramagalense e pelo Sr. João Manito.

Um reconhecimento especial ao Sr. Sérgio Aparício dos Santos, Sr. Manuel Quirino Manana, Sr. João Manito, entre outras vozes, pelo apoio e disponibilidade.

1 - O investigador é o principal instrumento de pesquisa pois observa os locais, os objetos e os símbolos, observa as pessoas, as atividades, os comportamentos, as interações verbais, as maneiras de fazer, de estar e de dizer, observa as situações, os ritmos, os acontecimentos. 0 investigador, participa, duma forma ou de outra, no quotidiano desses contextos e dessas pessoas. Regista sistematicamente observações, informações, reflexões e até mesmo estados de espírito". Veja-se SILVA, Augusto Santos, PINTO, José Madureira (org), “Metodologia das Ciências Sociais”, Biblioteca das Ciências do Homem, Edições Afrontamento, 14a Edição, 2007, pp. 132,13.

2 - “Foi determinado por Eduardo Duarte Ferreira que o músico que não estivesse à hora, pagaria $10, e o que faltasse ao ensaio sem motivo justificado e aceite, seria multado em $30 ”, in Sociedade Artística Tramagalense, 100 anos com muita História, Edição Sociedade Artística Tramagalense, 2001, p. 18.

3 - Entrevista realizada a 1/03/2008 ao Sr. João Manito, antigo membro da direção da S.A.T., a partir do ano de 1957.

  • 4 - Foi organizado um passeio fluvial até à Quinta da Cardiga, para acompanhar a Filarmónica que se deslocava a Vila Nova da Barquinha.
  • 5 - "0 Grémio deixou de ser Grémio quando o Estado fez os Grémios da Lavoura, do Comércio, esses Grémios, vá lá, estatais. Os outros que haviam, de recreio, eram obrigados a mudar de nome." - Relato do Sr. João Manito.
  • 6 - Interessante a observação feita nos estatutos do Grémio Musical Tramagalense, que divide as 'diversões' em ordinárias (jogos de cartas, bilhar e outras consideradas licitas) e extraordinárias (música e dança e “deverão realizar-se uma primeira vez em cada mês e a segunda quando a direção o julgar conveniente segundo a época podendo a direção aumentar o número delas e torna-las mais luzidas com receitas e saraus conforme os recursos do Grémio", in Estatutos do Grémio Musical Tramagalense, Capitulo VII - art.º. 23°.
  • 7 - Desde 10 de Abril de 1993 é detentora do estatuto de utilidade pública.
  • 8 - Veja-se Sociedade Artística Tramagalense, Op. Cít, p. 18.
  • 9 - O Grupo Cénico constitui um agrupamento teatral, filiado na Associação Portuguesa de Teatro Amador, cujos princípios são “A amizade e a franca convivência (..) que cada um se deve propor cultivar e atingir”, in Estatutos do Grupo Cénico da SAT III Composição, Artigo 3°, de 1986.
  • 10 - Entrevista realizada no dia 6/03/2008 ao Sr. Manuel Quirino Manana, antigo membro da Direção da S AT., a partir do ano de 1938.
  • 11 - Relato do Sr. João Manito.

12 - Relato do Sr. Manuel Quirino Manana.

  • 13 - Leia-se, a fazer a corte.

14 - Alguns elementos do Grupo de Teatro da S.A.T., colaboraram com o Grupo de Teatro Fatias de Cá, de Tomar, entre 1986 e 1991, com as peças "Crónica dos Bons malandros" e "A Marmita". De referir que ainda hoje essa colaboração se mantém.

15 - Ensaiada por Luís Grácio.

16 - Embora as datas não sejam precisas, estas peças foram postas em cena depois do ano 2000.

17 - Conhecido entre os habitantes Tramagalense por José Joaquim 'Capote’.

  • 18 - Informação disponibilizada pelo Sr. João Manito.

19 - Relato do Sr. João Manito.

20 - Esta Comissão teve início após o 25 de Abril de 1974 e foi extinta no início dos anos 90.

21 - Veja-se Sociedade Artística Tramagalense, Op. Cit, p. 18.

22 - Tuna era o nome dado ao Teatro Tramagalense Lda, o ‘eterno rival' da S.A.T.

23 - Relato do Sr. João Manito.

24 - De referir que, o Livro de Atas correspondente aos anos 1958 a 1961 não foi encontrado, pelo que, não foi possível confirmar os acontecimentos da referida Assembleia Geral.

25 - Falou-se em montar o coreto na zona da Penha, algo que, até aos dias que correm, não se realizou.

  • 26 - Relato do Sr. Manuel Quirino Manana.

27 - Esta biblioteca sempre funcionou apesar de não ser para consulta do público em geral. Ainda hoje, a sede da S.A.T. tem uma coleção de livros, que na maioria das vezes, foram oferecidos pelos sócios.

  • 28 - Alguns dos sócios da S.A.T. acreditam ter sido prejudicados, a nível profissional (na MDF), por pertencerem àquela coletividade. Muitos deles, confessam, nunca ter entrado na Tuna para assistir ao cinema, preferindo fazer até viagens, a pé, pela linha do comboio, até ao Rossio para assistir ao cinema.
  • 29 - Apontando para a planta do coreto que tinha em cima da mesa.
  • 30 - Veja-se Sociedade Artística Tramagalense, Op. Cit, p 19.
  • 31 - Relato do Sr. João Manito.
  • 32 - A S.A.T teve também uma Escola de Música (no início dos anos 90) e uma banda, a SATband (em 1986), sob a coordenação de Fernando Barralé mas que passados poucos anos, se extinguiram.

IN: MENDES, Ana Paredes – Sociedade artística Tramagalense: um passeio às nossas memórias. Zahara. Abrantes: Centro de Estudos de História Local. ISSN 1645-6149. Ano 6. Nº 11 (2008), p. 72-80