UM PORTUGUÊS QUE "BISOU" NOS JOGOS OLÍMPICOS

Antonio martins

Numa muito bem elaborada publicação, denominada "In Memorian", datada de 1930, precisamente no ano em que a morte lhe ceifou a vida, Henrique Martins e Martins Júnior, este um dos seus irmãos, definem perfeitamente a personalidade de António Martins, classificando-o como "glorioso desportista, eminente médico, grande homem de ciência, um santo amigo e um modelar português".

Para o professor Gentil Martins, também ele um homem de ciência, distinto médico e uma personalidade igualmente bem identificada com o fenómeno desportivo, pois, para além de ter (também) participado numa edição dos Jogos Olímpicos - em 1960, em Roma, na variante de tiro livre a 25 metros preside à Comissão dos Atletas Olímpicos, Portugueses - seu pai, foi mesmo o melhor atleta português de todos os tempos.

Tendo falecido em condições verdadeiramente trágicas, aos 38 anos de idade, varado pela bala de uma carabina, quando, decorria, na carreira de Tiro de Pedrouços, um concurso de tiro, António Martins, entre outras proezas dignas de registo, cotou-se como o primeiro atleta português, a "bisar" numa edição dos Jogos Olímpicos, ao competir, em Paris, em 1924, em dois modalidades bem diferentes, no atletismo e no tiro.

Só uns bons anos depois, um outro atleta luso (Roberto Durão), ao participar no pentatlo moderno e em esgrima, viria a igualar a façanha do médico nascido em Abrantes, a cidade que recordes as proezas dente seu ilustre filho, concedendo o seu nome a uma das suas artérias e ao mesmo tempo erguendo um busto em sus homenagem.

Recorde-se que, nesses Jogos Olímpicos de Paris (1924), António Martins lançou o disco a 32,40 metros, com o norte-americano, Lieb, com 44,83 m., a sagrar-se vencedor, enquanto no tiro, a equipas nacional, constituída por António Martins, Anísio Soares, Andrea Ferreira, Santos Guerra, Félix Bermudes, Francisco Real, Dario Canal e António Montez, viu este último, ao classificar-se em 20° lugar, na prova de carabina a 50 metros, conseguir a melhor posição.

Desportista amador que por canto, António Martins, antigo combatente da Grande Guerra, em França, onde integrou um contingente do regimento de Infantaria 23, com o posto, de tenente médico, para além do seu fino trato, revelou- -se sempre um atleta de admirável espírito olímpico, o que lhe granjeou não só o respeito de todos aqueles que com ele conviviam, como a grande admiração de todos os seus adversários.

Tendo estudado em Santarém e em Coimbra, onde deu os seus primeiros passos, como praticante desportivo, uma necessidade devido às naturais dificuldades físicas que então revelava, aquele que, mais tarde, viria a representar Portugal nos Jogos

Olímpicos de Antuérpia (1920) e de Paris (1924) confinar-se-ia também, como um aluno exemplar ao conseguir um 19, no seu exame de Anatomia e, em Julho de 1922, ao defender tese, a sua aprovação com 20 valores.

Daí que não tivesse surpreendido o convite que lhe foi dirigido pelo professor Egas Moniz, para colaborar com o futuro Prémio Nobel da Medicina, nos estudos da angiografia cerebral.

Verdadeiro Embaixador de Portugal no mundo do tiro

Figura deveras admirada e muito respeitada no mundo do tiro, sobre António Martins escreveram-se referências deveras significativas, tal como esta "não havia atirador estrangeiro que não conhecesse Portugal através dessa grande figura sorridente, afável e generosa que era o doutor António Martins.

Elogiado por monarcas, tal como aconteceu com Afonso XIII; de Espanha, em Santander, com o rei diplomatas a defini-lo como um dos grandes expoentes de Portugal e por outros homens do Estado, como Sidónio Pais, António Martins, era frequentemente citado por outras figuras de relevo na vida portuguesa, desde o escritor Afonso Lopes Vieira aos adores Chaby Pinheiro, Carlos Leal e Alfredo Ruas.

Mesmo tendo pertencido a uma geração com notáveis serviços na difusão do atletismo português, tais como Correia Leal, Francisco Nobre Guedes, Xavier de Araújo, Armando Cortezão, António e Francisco Stromp e José Salazar Carreira, o Governo português, ao conceder-lhe, a 30 de Dezembro de 1930, j6 depois da sua morte, o grau de Cavaleiro da Ordem Militar de Torre e Espada, fazia publicar no Diário do Governo o seguinte "pelos altos serviços que A Pátria prestou como cirurgião, como combatente da Grande Guerra e como atirador exímio."

Dois meses antes, Portugal acabara de perder uma das suas mais significativas personalidades, o doutor António Martins, que deixava viúva D. Maria Madalena Gentil Martins, deixando, ao mesmo tempo, enlutado um país que tanto se orgulhava das proezas do mestre atirador, que já estava selecionado para os Jogos Olímpicos de Los Angeles (1932) e que encontrara a morte, na carreira de Tiro de Pedrouços, ao poisar a sua própria carabina com a coronha sobre o pé direito, seguindo-se o disparo, com a bala de chumbo, de calibre 22, a alojar-se no occipital, destruindo- lhe os tecidos vitais do cérebro.

Acompanhado pelo dr. Ayala Boto, o dr. António Martins ainda foi conduzido ao Hospital de S. José, falecendo cerca do meio-dia, quando tinha apenas trinta e oito anos de idade e tanto havia ainda a esperar do homem de 1,89 m. de altura, com 99 quilos de peso então considerado um dos melhores atiradores de pistolas do Mundo.

Sobre ele escreveria ate Salazar Carreira, uma personalidade bem identificada com o desporto português dos anos trinta e quarenta "era uma figura que nós apontávamos uns aos outros como um exemplo de virtudes desportivas. Era, em síntese exata, uma alma sã num corpo forte. Rigidez de princípios, escrúpulo melindroso das suas responsabilidades, lutando com ardor e vontade pelas suas cores, mas sempre estimulando o adversário como um amigo e nunca como um rival. Quando o atleta do Sporting, José Granel, bateu, no Porto, o recorde nacional do lançamento do disco, que pertencia a António Martins, foi deste que recebeu o primeiro telegrama de felicitações".

No seu funeral, para o cemitério do Alto S. João, viriam a incorporar-se mais de cinco mil pessoas, com muitos organismos desportivos como as Federações de Tiro, de Atletismo, de Futebol, de Boxe, de Esgrima e clubes como o Sport Lisboa e Benfica, o Sporting Clube de Portugal, o Boavista, o Clube Nacional de Natação, o Luso do Barreiro, a integrarem-se no adeus aquele que, ainda hoje, haja quem o considera o melhor atleta português de sempre.

Antonio martins1

 HISTÓRICO DO CIF: António Martins, um super-campeão de atletismo                                                                            MESTRE NA ARTE DE ATIRAR: o doutor António Martins, na carreira de tiro de Pedrouços, onde  viria a encontrar a morte

 

NOME: ANTÓNIO Augusto da Silva MARTINS

NASCEU: 04-04-1892, em Abrantes, S. Miguel do Rio Torto

FILHO: de D. Esperança Augusto da Silva Martins e de João Augusto da Silva Martins

FALECEU: 03-10-1930, em Lisboa, vítima de um acidente numa prova de tiro.

MODALIDADES: tiro e atletismo

CLUBES: Club Internacional de Football (CIF) e Sociedade de Tiro N° 2, antigo Grupo Pátria

CARGO: Delegado da Federação de Tiro Nacional na União Internacional de Tiro PALMARES: No Atletismo

1912 - Ingressou no Club Internacional de Football (CIF), juntamente com Correia Leal e, nesse mesmo ano, consegue os recordes de Portugal, no lançamento de peso (9,78 m.) e do salto em altura sem corrida (1,33 m.);

1913 - Melhorou os recordes nacionais de peso, durante o campeonato olímpico (9,99 m.) e o do salto em altura sem corrida (1,40 m.), conseguindo também o recorde nacional no lançamento do disco (32,35 m.)

1914-1915 - Consegue os seguintes recordes em competições denominadas antes dos Jogos Olímpicos, no lançamento de peso (10,45 m.), lançamento do dardo (37,20 m.) e salto em comprimento sem balanço (3,11 m.), com este último a durar mais de quinze anos;

1920 - Em Antuérpia, nos Jogos Olímpicos, bateu o recorde nacional de peso, com 10,99 m.);

1921 - Conseguiu os recordes nacionais do lançamento do disco (35 m.) e do lançamento do peso com as duas mãos (20,23 m.);

1922 - 2o lugar no Campeonato de Portugal, no lançamento do martelo conquistou 12 títulos de Campeão de Portugal, obtendo 10 recordes, nacionais, nos lançamentos de peso, disco e dardo e nos saltos em altura e em comprimento, sempre em representação do CIF.

No Tiro

Mestre atirador em todas as modalidades na época.

Campeão de Portugal com espingarda de guerra em 1917, 1919, 1920, 1921 e em 1925;

Campeão de Portugal de pistola de guerra de 1920 a 1928;

Campeão de Portugal de pistola livre de 1925 a 1929;

Batismo internacional nos Jogos de Pershing, em França, (1919) no último período da guerra, onde se classificou em Io lugar, com pistola;

Vencedor do Torneio dos Reis, em 1924 e em 1925;

Vencedor de competições realizadas na Suíça (1926), Roma (1927) e Holanda (1928), Le Mans, Paris, Estocolmo, Paris e Reims;

Integrou a equipas de Portugal que se classificou em 2o lugar, na prova dos "Matches" latinos, onde triunfou a Itália, seguida de Portugal, Franca, Espanha e Roménia;

Vencedor do Troféu "Salve Sabroso" (1927 e 1929);

Campeão do Mundo (1928) nas disciplinas com espingarda de guerra e na posição de pa;

28 Vezes campeão de Portugal em carabina livre, espingarda de guerra, pistola de guerra, pistola de precisão, pistola de duelo, pistola de tiro rápido e carabina de precisão;

Representou Portugal em duas edições dos Jogos Olímpicos, respetivamente em Antuérpia (1920) e em Paris (1924), competindo, em 1920, nas modalidades de tiro e nas disciplinas de pistola e carabina e, quatro anos depois, nos Jogos da Cidade Luz, para além do tiro, participou também em provas de atletismo, lançando o disco.

Galardões: Torre e Espada, Ordem de Cristo e Medalha da Vitória, concedida pelo Governo de França; Grau de Cavaleiro da Ordem Militar de Torre e Espada (1930), atribuído pelo Governo de Portugal; Medalha de Ouro, do Clube Internacional de Football (CIF).

In: ARSÉNIO, Carlos - Ribatejo: terra de campeões: 1892-2008. Chamusca: Edições Cosmos, 2008. ISBN 978-972-762-309-9