O SENHOR SÃO SILVESTRE, DO BRASIL

manuel faria2

Manuel Faria, nome grande do atletismo português, autenticamente o grande senhor de São Silvestre, a prova do fim do ano, mais famosa, do Brasil e que o nosso compatriota venceu em dois anos consecutivos, colocando em delírio, não só todos os portugueses radicados no grande país irmão, como enchendo até de orgulho todos aqueles que falam o idioma de Camões.

Ao decidir-se pela sua não participação nos Jogos Olímpicos de Melbourne, dizendo "não tenho condições para me bater com os melhores do Mundo", concentrou, juntamente com o seu treinador, Luís Aguiar, todas as suas atenções na famosa São Silvestre, de São Paulo, onde participara, pela primeira vez, em 1954, alcançando apenas, o 40° lugar, com o famoso checo Zatopek, a vencer quase como e quando quis e Manuel Faria, a referir, na altura "só não desisti por vergonha. Durante algum tempo, ainda tentei seguir Zatopek, mas, depois, os músculos e as pernas não funcionaram."

Dois anos depois, tendo como seu massagista e até conselheiro, o antigo ciclista do FC Porto, Dias Santos, vencedor de uma edição da "Volta a Portugal", Manuel Faria excedeu todas as expectativas, ganhando uma corrida com largas centenas de participantes e fazendo subir ao mastro de honra a bandeira de Portugal.

Em 1957, o leão de Alvalade, viria a "bisar", repetindo então a proeza que havia conseguido em 1956, mas, desta feita, levando a melhor sobre os mais credenciados atletas do Mundo, tais como o russo Vladimir Kutz, recordistas mundial dos cinco e dos dez mil metros, que apenas se classificaria em oitavo lugar.

Iniciando-se, em 1948, no Sporting, no torneio "O Primeiro, Passo “que tantos talentos descobriu para o atletismo português, Manuel Faria logo aí, deu mostras de uma bem visível capacidade com a sua ampla passada e o seu largo espírito desportivo, a tornarem-se decisivos na conquista dos mais variados êxitos, a nível interno e no piano internacional.

Em janeiro de 1995, numa entrevista a "Record", Manuel Faria, dizia-nos:

"A minha primeira vitória na S. Silvestre, de São Paulo, aconteceu, há já trinta e oito anos e, para além do grande prazer que tive em ficar à frente daquela gente toda, a maior alegria correspondeu à satisfação que o meu êxito proporcionou aos portugueses radicados no Brasil, mais concretamente em São Paulo. Vi lágrimas de alegria nos olhos de muitos deles, o que jamais esquecerei e isso constituiu o meu mais apetecido prémio, muito embora me tivesse sido oferecido um bonito colar de pérolas, que ainda hoje conservo com orgulho".

"Um prémio de cem contos que deu um jeitão..."

Mesmo deveras encantado com as homenagens que, então havia recebido dos portugueses residentes no Brasil, naturalmente orgulhosos da primeira vitória de um seu compatriota, na famosa S. Silvestre, de São Paulo, só um ano depois, ao repetir o triunfo na tão prestigiante corrida brasileira, Manuel Faria teve direito a uma considerável compensação financeira, tal como nos diria:

"Sim, houve um prémio de cem contos, que na altura, me deu um jeitão. Conquistei medalhas bem bonitas, que ainda hoje conservo e ganhei, nessa prova, outros troféus, mas, aqueles cem contos vieram mesmo a calhar."

A seguir a um 40° lugar que deixou os portugueses naturalmente desgostosos, Manuel Faria viria a ser o protagonistas de uma autêntica proeza, ao vencer, em dois anos consecutivos, uma corrida onde levou a melhor sobre os mais cotados atletas do Mundo da época, desde o alemão Schade, medalha de bronze dos Jogos Olímpicos de Helsínquia, o jugoslavo Drago, o argentino Suarez e muito especialmente, o russo Vladmir Kutz, campeão olímpico e recordista mundial dos cinco e do dez mil metros, todos eles incapazes de resistir à classe e firme determinação do português Faria.

"Na verdade, ao longo da minha carreira, onde até acabei por conseguir algumas bonitas vitórias, mas ter-me-á faltado uma presença nos Jogos Olímpicos, onde, muito sinceramente, poderia obter razoáveis resultados. Tal hipótese acabou por não se concretizar e foi pena", acrescentaria, na entrevista a "Record".

Funcionário, durante largos anos, da empresa Gaz Cidla, Manuel Faria, depois de colocar um ponto final, na sua brilhante carreira de atleta, manter-se-ia ainda ligado ao Sporting Clube de Portugal, colaborando com o professor Moniz Pereira, na "descoberta" de novos talentos do prestigioso clube português, um dos quais (Carlos Lopes) viria, largos anos depois dos seus êxitos, na S. Silvestre, a seguir-lhe as pisadas, vencendo também, a famosa corrida de São Paulo. Quando do seu falecimento, Fernando Ferreira, antigo treinador do Benfica e selecionador nacional, quando Manuel Faria correu as cinco edições do "Cross das Nações", lamentando o seu desaparecimento, afirmava "era um companheirão, um atleta muito disciplinado e que deixa muitas saudades. Dei-me sempre bem com o Manuel Faria e a sua morte deixa muito mais pobre o atletismo português, como todos nós."

Logo na altura do seu falecimento, a Imprensa da região onde nasceu, lembrou o dever da Câmara Municipal de Abrantes, perpetuar a sua memória, já que Manuel Faria, foi inegavelmente, um dos grandes vultos do atletismo português, honrando e prestigiando sempre a terra onde, pela primeira vez, viu a luz do dia.

 manuel faria  manuel faria1

O SENHOR DA SÃO SILVESTRE - Manuel Faria, de forma decidida, corre para uma grande Vitória na prestigiosa corrida de São Paulo, enchendo de alegria centenas de portugueses, radicados no Brasil

HISTÓRICO DO SPORTING: Manuel Faria figura por mérito próprio, na história do prestigioso clube português

NOME: MANUEL José FARIA

NASCIMENTO: 12-12-1930, em Abrantes (Freguesia de S. Miguel do Rio Torto) FALECEU: a 07-08-2004, em Queluz

CLUBE: Sporting Clube de Portugal, de 1948 a 1962, como atleta e de 1962 a 1980, como técnico.

CURRÍCULO: Vencedor da S. Silvestre, de São Paulo (1956 e 1957); 2o classificado e 4o classificado, dessa competição, em 1958 e em 1959; vencedor por duas vezes do Grande Prémio de Barcelona; recordistas de Portugal em todas as distâncias, entre os 1.500 metros e os 10.000 metros; batendo, entre 1954 e 1957, por dezoito vezes, os recordes, dessas provas;

Cinco presenças no "Cross das Nações; uma presença no Campeonato da Europa; campeão de Portugal, pelo Sporting CP, treze vezes; na 1.500 m., 5.000 m., 10.000 m., e em corta-mato.

Trinta presenças na seleção nacional, nas mais variadas competições internacionais, atuando no Brasil, Espanha, Franga e Irlanda.

In: ARSÉNIO, Carlos - Ribatejo: terra de campeões: 1892-2008. Chamusca: Edições Cosmos, 2008. ISBN 978-972-762-309-9