José Martinho Gaspar*

    O historiador tem que se apresentar isento perante o seu objecto de estudo, despido de preconceitos, liberto de julgamentos. Porém, neste caso particular, ainda que esta questão aparentemente se coloque, ela torna-se secundária. Desta vez, com o rigor possível, o aprendiz de historiador tem como alvo do seu trabalho a aldeia onde nasceu e tal realidade abala os pressupostos do estudo. Desta vez não se guiará por objectivos formais, antes abrirá espaço a desígnios: o conhecimento possível do passado de Água das Casas, pequena aldeia do extremo norte do concelho de Abrantes; a capacidade que alguém, que nasceu e viveu cerca de vinte anos num local, tem para contar os sons, cheiros, sabores e emoções desse sítio. A tarefa é do domínio da História, com estórias, mas é primeiro que tudo obra de poesia ou um encantamento muito intimista.

Retalhos de um percurso
    É possível encontrar o topónimo Água das Casas em documentos do século XIV1 . A localização de um pequeno núcleo habitacional nas proximidades de um conjunto de regatos a confluir para a ribeira de Codes será a principal razão que originou a denominação atribuída à localidade.
    A tradição oral, fonte primeira para a elaboração deste trabalho, aponta para a fixação primitiva da aldeia numa zona designada Esteveira, localizada a duas centenas de metros do actual povoado, na direcção de Vale de Açor. Nesse local existem ainda alguns vestígios de antigas habitações e, em Água das Casas, os descendentes das famílias que terão habitado esse espaço são ainda alcunhados "Esteveiras".


    A aldeia, no começo do século XIX, como aconteceu um pouco por todo o lado na região, foi alvo de saques no decurso das invasões francesas. Diz-se que naquela que foi a "Casa da ti Noiva" os franceses sob o comando de Junot abriram as arcas de cereais e transformaram-nas em manjedouras para os seus cavalos. Até há pouco tempo, não era raro encontrarem-se restos de talhas enterrados, tanto no interior de antigas Õ habitações como em zonas agrícolas, com o objectivo de esconder os enchidos e o azeite dos invasores esfomeados.
    O núcleo populacional actual formou-se com a chegada de três famílias: Franciscos, originários do Brejo, concelho de Vila de Rei; Baptistas, provenientes do Mógão, concelho de Sardoal; Mouros, de origem desconhecida, cuja descendência pela via feminina deu origem ao apelido Moura. A partilha das águas de rega ainda hoje se faz tendo como ponto de partida a divisão em três quinhões por esta trindade.
    Água das Casas distribui-se por três espaços diferenciados: Casal, núcleo habitacional onde o povoado se estruturou inicialmente; Cabeço, zona elevada, na continuidade do Casal, para onde a aldeia cresceu; Barro, zona baixa, de terras argilosas, com casas dispersas, que ganhou alguma importância com a construção das estradas de acesso no decurso da segunda metade do século
    A aldeia, vítima da desertificação típica dos espaços rurais de interior, possui actualmente uma população residente inferior a 100 pessoas, quando há duas décadas dispunha de quase o dobro dos habitantes. Já aqui não existe qualquer jovem em idade escolar e mais de 90% da população tem mais de 55 anos. Apesar de vislumbrarmos a recuperação de algumas habitações, ela é feita por 'filhos da terra" que depois de aposentados estão a regressar às origens. Apesar deste envelhecimento dos residentes, a aldeia tem podido sobreviver — com as suas tradições e muitos dos seus campos cultivados — graças a uma geração que nela nasceu e que aqui passa muitos fins-de-semana a conviver e a trabalhar. Será, porém, a última geração com tais características, pois os seus filhos nasceram fora da aldeia e, se é verdade que gostam dela, mais certo é que não continuarão a trabalhar a terra ou a matar o porco.

No reino das águas

    O destino de Água das Casas foi traçado sobre linhas de água. A localidade instalou-se onde o regadio era possível e buscou na fertilidade dos nateiros do Codes o milho para o seu sustento. Homens transformados em heróis míticos desviaram vezes sem conta o curso das águas, mas quando a cheia era exagerada tornava-se necessário, como Sisífo, iniciar todo o percurso desde o começo.
    Mas nem só o Codes ditou a sua lei, pois também as terras de cota mais elevada tiveram direito à água de duas levadas — do Vale e do Rabaçal — que ainda continuam a correr e deram, ao longo dos tempos, noites em claro a muitas gerações. Até há vinte/trinta anos, altura em que foram construídos vários tanques, era habitual as mulheres regarem durante a noite, qualquer que fosse a hora. Em tempos mais recuados, ia-se, à luz de uma candeia de azeite, buscar a água à meia-noite ao Vale — nascente afastada da aldeia —e algumas vezes nem se chegava a regar, uma vez que a dada altura era dada a voz de "ougar a Argueira", ao que várias pessoas, munidas de ougadouros, lançavam a água para as terras (ditas de sequeiro) que estavam acima da levada, impedindo que ela chegasse ao destino. Estas águas funcionavam ainda como fonte de energia para as azenhas do Vale (mais antiga) e do Lagar (mais recente) e para o próprio lagar de azeite.
    A gestão das águas de regadio é um dos aspectos particularmente curiosos da localidade: a limpeza das levadas — hoje maioritariamente substituídas por canos — a que todas as casas tinham o dever de enviar um elemento, a partilha das águas pelas três famílias colonizadoras e o próprio horário das regas, que até há pouco tempo se fazia pelo horário solar. Durante anos, no Verão, Agua das Casas viveu nesse desfasamento de uma hora e meia que mediava entre a "hora antiga" ou solar das regas e o horário oficial da telefonia.
    A construção da barragem de Castelo de Bode transformou a paisagem nesta parte da ribeira afluente do Zêzere que é o Codes. O poeta popular na parte final de uma das muitas quadras que dedicou à albufeira, referindo-se a Água das Casas, é sintomático: «(...) Levaram-te as melhores terras, deixaram-te aponta do cabeço»2. A aldeia transformou-se, com o enchimento da albufeira, no início dos anos cinquenta, numa península e as suas gentes ou se adaptaram a um quotidiano ainda mais sacrificado ou integraram o forte êxodo rural que marcou o país por esta altura. A migração sazonal para as arroteias nas lezírias ribatejanas ou para as ceifas no Alentejo deixava de ser suficiente para equilíbrio de orçamentos familiares normalmente deficitários, além disso a aposta na industrialização nas imediações de Lisboa buscava novos braços de trabalho.

Mouras, bruxas e lobisomens

O quotidiano da aldeia era marcado pela dureza dos trabalhos agrícolas, tanto para homens como para mulheres. Face à debilidade dos orçamentos familiares, se os homens saiam sazonalmente para ceifas, sachas ou arroteias, já as mulheres, sobretudo antes de casarem, trabalhavam na recolha de madeira de pinho, em que, quais máquinas, carregavam por encostas íngremes, sobre a cabeça, toros que chegavam a pesar oitenta quilos. Todos estes trabalhos se faziam de sol a sol, sendo necessário, no caso destas mulheres, sair de casa de candeia acesa e regressar novamente alumiadas pela luz do azeite. Nas arroteias, por sua vez, a labuta iniciava-se com a "estrela da manhã", mas o cansaço não impediu que esse tenha sido o momento para alguns mais velhos ensinarem os mais novos a escrever, depois da longa jornada de trabalho, para poderem enviar uma carta à família.


    O contacto social, mesmo dentro da família, fazia-se em conversas ao serão, grande parte do ano à lareira — com a função de aquecer mas também de cozinhar — ou nas eiras, em descamisadas ou debulhas de milho. Muitas vezes essas conversas versavam coisas de bruxas, lobisomens ou mouras encantadas. Em Agua das Casas, há 70 ou 80 anos, rara era a pessoa que não conhecia alguém que diziam ser bruxa ou lobisomem, que não vira as bruxas ao longe a fazerem um baile numa encruzilhada ou que não possuía na família alguém que tivesse passado por um qualquer encantamento. Estas histórias, que se integram num imaginário típico da região, como pode ser constatado na recolha efectuada por Isilda Jana3 , funcionam como uma explicação do real num mundo distante do conhecimento científico e assumiam um valor simbólico estruturante no viver da comunidade.
    Agora, diz-se, desde que chegou a electricidade (1980) deixaram de se ver as bruxas e desapareceram os lobisomens. Quanto a caldeiras encantadas cheias de moedas de ouro, como a que está no largo da fonte do Cabeço .com o arco gasto de tanto o pisarem), já ninguém sonha com elas três noites seguidas para, assim, poder defrontar o cavaleiro que as guarda desde tempos imemoriais. Ou será do alcatrão que neste início do século XXI passou a asfaltar as ruas de Agua das Casas?

Quebrar o quotidiano com um pau de junco

    A festa, em particular nos meios rurais, assume uma importância determinante de ruptura face ao ramerrão que marca as tarefas agrícolas, ao ritmo da chuva ou do sol das diferentes estações do ano. Para além disso, as festividades, normalmente com uma vertente religiosa, interditam o trabalho e abrem espaço à licença e até ao exagero, seja na aproximação entre rapazes e raparigas seja no comer e no beber.


    Em Água das Casas, no passado, não se realizavam festas de grande brilho, à excepção dos festejos que, em meados do século XX, marcaram a distribuição/recolha do correio ou que, em 1958, assinalaram a inauguração dos chafarizes da localidade. Na abertura das fontes, conta-se, veio um grupo musical de fora e a farra atingiu tal dimensão que alguns elementos da banda foram "obrigados" a permanecer na terra, prolongando-se as comemorações até segunda-feira. De resto, sem local de culto (excepto uma pequena ermida mandada construir por José Francisco da Silva, em honra de Nossa SP. de Fátima, há cerca de cinquenta anos), os habitantes de Água das Casas veneravam Santa Águeda, padroeira de Maxial. O dia da romaria era a oportunidade para saborear um galo guardado para a ocasião e de marcar presença na aldeia vizinha com uma fogaça.
    Entretanto, aos domingos, rapazes e raparigas divertiam-se em bailes que decorriam nas várias aldeias da região. Molhava-se o chão de um largo central, para não levantar poeira, e era tempo de dançar ao toque de uma "flaita" (gaita de beiços) ou de um acordeão. Na primeira metade do século XX, era habitual os homens da região fazerem-se acompanhar de um pau de junco nas suas deslocações, amparo para longas caminhadas, braço direito num tempo marcado por algumas violências inter-pessoais e ataques de animais. Em muitos bailes, por questões de raparigas (indivíduos que "não davam licença" a quem se propunha dançar com o seu par), os jovens de Água das Casas envolveram-se em zaragatas medonhas, valendo-lhes a habilidade que tinham no jogo do pau. Houve, porém, uma situação, no início dos anos trinta, em que uma refrega atingiu tais proporções que a aldeia acordou cercada pela GNR e muitas famílias acabaram por viver dias dramáticos em virtude das quantias que foram obrigadas a pagar pelas instâncias judiciais.


Pesagem do porco

Quem mata o seu porco...

    A quadra natalícia sempre se viveu de forma bastante intensa em Água das Casas. As festividades religiosas comemorativas do nascimento de Cristo contribuem para esta situação, mas a principal causa está no facto de ser nesta altura que se fazem as matanças dos porcos. Era no dia a seguir ao Natal que tradicionalmente se matavam os suínos, que todas as famílias criavam com o que a terra lhes dava ao longo de um ano de dificuldades.
    Pela manhã, os homens da aldeia dividiam-se em dois grupos, formados ancestralmente, de dimensão mais ou menos idêntica — o Partido da Filhó e o Partido da Castanha Seca — e começavam a matança. Estas designações das sociedades estão ligadas, como é bom de ver, à comida que, num tempo de dificuldades, era colocada nas adegas para os homens petiscarem depois de abaterem os animais. Utilizando apenas o seu corpo, como se fossem forcados numa tourada, os homens apanhavam os bichos, que chegavam a ultrapassar as dez arrobas (de carne limpa), deslocavam-nos para o exterior do curral, onde, sobre uma banca, se procedia ao sacrifício. As mulheres, munidas de alguidares de barro, aparavam o sangue, principal ingrediente das morcelas, confeccionadas ainda nesse dia. Cada um dos partidos procurava terminar o abate dos animais mais cedo que o rival, sendo usual aquele que primeiro concluía a tarefa lançar um estrondoso foguete.
    Posto isto, era tempo de "chamuscar e entesar" os animais, recorrendo a carquejas a arder, para, depois de lavados, abertos e pendurados, se extraírem as tripas, que as mulheres lavavam nas ribeiras ou na albufeira. No dia a seguir, depois da carne estar mais seca e fria, "desmanchava-se" e ao terceiro dia salgava-se a carne, excepto a que se destinava aos enchidos, e acondicionava-se nas salgadeiras.
    A carne de porco era fundamental para a sobrevivência das famílias, distribuindo-se o seu consumo por todo o ano. Por exemplo, era habitual comer-se o bucho (morcela de grandes dimensões) na altura da apanha da azeitona, isto é, no final do Outono, princípio do Inverno seguintes. Apesar de poder parecer estranho, era costume trocarem-se os presuntos por toucinho proveniente do Alentejo, que permitia temperar a panela da sopa de legumes, frndamental no regime alimentar destas gentes.
    Um aspecto igualmente digno de nota a propósito das matanças é a pesagem dos porcos. No dia da matança, ao final da tarde, todos os homens da aldeia, agora em conjunto, pesavam os animais. Cada pesa era antecedida de palpites e mesmo de apostas, intercaladas com um copo de tinto e uma cantiga à desgarrada4 . No final, o dono do porco mais pesado era "o da bandeira", título cujo troféu se traduzia "apenas" em dispor de mais carne na sua salgadeira.
    Actualmente, a tradição das matanças mantém-se na medida das possibilidades: não são obrigatoriamente no dia a seguir ao Natal, já não há partidos, muitos dos animais já não são criados em Água das Casas, recorre-se a um cabo de aço ou a uma corda para dominar os bichos, chamusca-se com um maçarico e a carne armazena-se em arcas congeladoras. Mas, continua a haver um clima de amizade e entre-ajuda que, na região, até prova em contrário, não tem comparação.

Das festas de Verão a um associativismo peculiar

    Em 1976, um grupo de homens avançaram com o projecto de realizar uma festa de Verão em Água das Casas. Efectuaram-na no Barro no último fim-de-semana de Julho e, apesar dos receios de organizar uma festividade numa terra pequena, ela foi um sucesso e iniciou um processo que até hoje se tem repetido todos os finais de Julho. Hoje a festa não terá, porventura, a dimensão dos primeiros anos, mas continua a ser fundamental enquanto momento de reencontro de amigos e familiares.


    Por outro lado, algum dinheiro que se obteve com os primeiros festejos de Verão permitiu fazer arrancar uma dinâmica de construção de infra-estruturas e de melhoria da imagem da aldeia que são dignas de registo. Com algum apoio por parte da Câmara Municipal de Abrantes — trabalhos realizados por algumas máquinas e oferta de alguns materiais de construção civil —, o povo de Água das Casas deu corpo a vários projectos. Entre 1976 e 1979 levou a efeito a construção de um posto médico .com consultório, sala de espera e guichet para funcionário), que funcionou vários anos e que hoje se encontra desactivado. Nos anos 80, foram edificados um dancing e um coreto no novo recinto de festas, mas também um salão polivalente de grandes dimensões para actividades diversificadas (nomeadamente casamentos até cerca de 200 pessoas sentadas), com uma cozinha e casas de banho de apoio. Após a inauguração destas infra-estruturas, em 1986, arrancou-se para a construção de um bar na cave do referido salão. Já nos anos 90, avançou-se para os arranjos I I 1 na aldeia, em que através de acordos com proprietários foi possível melhorar arruamentos e criar largos mais adequados às necessidades de finais do século XX, nomeadamente o largo onde se realizam as festas de Verão.


    Por se sentir a falta de um espaço de culto e onde fosse também possível velar os defuntos, em 1993 foi concluída e inaugurada a Capela de Santa Maria Mãe de Deus, cuja festa ocorre a I de Janeiro de cada ano. A par das melhorias de ruas e de outros espaços públicos, no final dos anos 90, foi ainda possível construir um campo polidesportivo e colocar uma jangada com prancha na albufeira.
    Para que toda esta obra tenha sido realizada, não podemos deixar de destacar aquele que foi o seu grande mentor, Abílio Dias Alves5 . Integrado na organização das festas de Verão desde 1978, foi ele o líder de todo um projecto que culminou com tudo aquilo que é hoje o CSS.C.R.D. (Centro Social, Cultural, Recreativo e Desportivo) de Água das Casas. Aquela que é conhecida junto da Câmara Municipal de Abrantes como "a associação sem sócios", disponibiliza hoje aos habitantes e amigos da aldeia desde uma sala para festas, passando por um campo polidesportivo e, fundamentalmente, uma terra cada vez mais atraente, cada vez melhor para viver ou visitar.


    Abílio Dias Alves é merecedor deste destaque, quer na qualidade de Presidente da Direcção do C.S.C.R.D. de Água das Casas quer pela importância que teve para a aldeia, e porque não para a freguesia, enquanto membro da Junta de Freguesia de Fontes, entre 1994 e 2001. Esta distinção não secundariza, contudo, uma quantidade incrível de homens e mulheres de Agua das Casas que com a sua ajuda (trabalho, materiais, dinheiro ou projectos) foram determinantes para o sucesso de todo este empreendimento e que não era possível enumerar neste trabalho, correndo-se sempre o risco de alguém muito importante ficar no esquecimento.

 

 

 

Vicente Serras
Um século de informações privilegiadas

    Nascido a 7 de Junho de 1910 — ainda na Monarquia — Vicente Nunes Serras foi a principal fonte para os dados apresentados neste trabalho, em especial para os mais antigos.
    Este ancião contou-nos a sua vida e, deste modo, deu-nos a conhecer a História possível de Água das Casas. Foi às ceifas, às arroteias e tem fama de ter sido um fantástico "jogador de pau".
    Porém, as passagens que nos deu a conhecer não se ficam por aqui e remetem-nos também para os tempos de guerra com as respectivas dificuldades, como no caso da Guerra Civil de Espanha, período de muita fome, em que era necessário levantar-se às 6:30 horas para obter 250 gramas de pão.
    No final dos anos vinte rumou a Lisboa, onde encontrou uma capital ainda repleta de hortas e olivais. No começo da década de quarenta, depois de ter participado na construção do Instituto Superior Técnico, Vicente Serras trabalhava para a Sociedade Geral de Cargas e Descargas, pertencente à CUF. Com a Europa mergulhada na 2a Guerra Mundial, um navio jugoslavo preparava-se para uma reparação exactamente na Sociedade Geral, desencadeando-se um situação pouco comum. Depois de ter sido hasteada a bordo a bandeira italiana, a tripulação foi presa, mantendo-se no navio, ancorado no mar da palha, apenas o comandante, vigiado pela Guarda Fiscal e por funcionários da empresa. Este comandante tinha um rádio onde chegavam informações sobre o conflito, o que permitiu àqueles que o guardavam saber que a Alemanha invadira a Rússia muito antes de a notícia ser dada pela imprensa portuguesa. Quando obteve esta informação, Vicente Serras contou-a aos seus colegas de trabalho, que não acreditaram. Contudo, quando a notícia se confirmou "outros informadores" começaram a apoquentá-lo. Este episódio contribuiu para que percebesse o valor que a informação pode conter.

 

Notas
* Professor de História, natural de Água das Casas.
1 Cfr. Eduardo Campos e Joaquim Candeias Silva. Dicionário Toponímico e Etimológico do Concelho de Abrantes, Abrantes, Câmara Municipal de Abrantes, p. 14. O topónimo encontra-se presente no Tombo da Estremadura de 1396, depositado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
2 O poeta em questão era Manuel Coelho, natural de Valadas — Vila de Rei.
3 Vide Isilda Jana, Histórias à Lareira, Abrantes, Palha de Abrantes, 1997.
4 Todas as habitações possuem na cave uma adega (também armazém). igualmente designada loja ou "aloja". Não existem tabernas e, todos os dias ao final da tarde, é habitual os homens juntarem-se na "sociedade" ou 'volta" em que vão de adega em adega, bebendo e conversando.
5 Parece-nos ainda digno de realce o papel de José Francisco ("Barqueiro"), nos primeiros anos deste processo, que, pela actividade que desempenhava, dispunha de tempo para desenvolver as funções de tesoureiro.

 

 

 Artigo publicado na revista Zahara nº2 - dezembro 2003