Por Ana Paredes Cardoso e Mário Rui Fonseca (texto)

Por Eduardo Manuel Esteves e Jorge Pereira (fotografias)

As fotografias mais antigas retratam o Tramagal dos anos 50 e 60 em locais outrora bastante frequentados. A diferença entre o registo antigo e o atual é prova de vitalidade temporal; comparados, conferem uma sensação de despojamento e também de rutura. Mas os espaços estão lá, continuam lá. São elementos de permanência, suporte de memórias, de identidade. A fotografia, enquanto documento histórico, permite-nos uma leitura, pela comparação e pela legendagem. Foi a proposta que a Zahara fez a dois fotógrafos de Tramagal: Eduardo Manuel Esteves, o autor das fotografias, e Jorge Pereira, que acedeu a retratá-las neste ano 2012 a partir do mesmo ângulo e posição do original.

DADOS BIOGRÁFICOS DOS FOTÓGRAFOS

Eduardo Manuel Esteves nasceu a 6 de dezembro de 1932, em São Miguel do Rio Torto. Aos seis meses foi com a família para Tramagal, onde vive até hoje.

Trabalhou na antiga Metalúrgica Duarte Ferreira, primeiro como serralheiro civil, depois “na papelada”, segundo as suas próprias palavras.

O seu gosto pela fotografia era partilhado com cinco amigos, todos amadores. Nos escritórios da empresa metalúrgica, foi solicitado para fotografar peças. A partir de então decidiu firmar negócio por conta própria. Em 1954 coletou-se como fotógrafo, profissão que manteve a par da fábrica, até ao início dos anos oitenta. “Ainda hoje lhe posso tirar um retrato, se quiser”, afiança-nos.

Durante as décadas de 50 a 90 do século passado, as fotografias retrato, de casamentos, batizados, festas religiosas e profanas, jogos de futebol, teatro, concertos de bandas filarmónicas e paisagens emblemáticas do Tramagal constituíram a atividade do fotógrafo autodidata. Um acervo, com largas centenas de imagens em retrato e outras tantas para recuperar dos microfilmes empoeirados, são hoje um valioso património documental sobre a história do Tramagal, que agora se apresenta, para já, nestas duas fotografias.

Jorge Pereira nasceu no dia 30 de janeiro de 1961, em Santiago do Cacém. Ali cresceu e dali partiu, em 1984, para exercer a profissão de enfermeiro no campo militar de Santa Margarida. O gosto pela fotografia mais elaborada e o reconhecimento público começam a ganhar forma a partir do momento em que passa à ‘reserva’. “Tinha mais tempo para me dedicar à fotografia, o meu passatempo preferido”, contou. A primeira ligação ao Tramagal surge em 1988, então como enfermeiro/massagista no TSU. Em 2001, mete a sua vida numa mala e muda-se definitivamente para a vila metalúrgica. “O Tramagal e as suas gentes mexeram muito comigo”, confessou. Munido da sua primeira máquina digital, a partir de 2009, começou a registara fauna do Vale do Tejo, a natureza, o património edificado e as ruas do Tramagal, as gentes, o desporto... Com colaborações regulares no jornal Abarca’, ‘O Mirante’ e em alguns jornais nacionais, Jorge ‘Santiago’ acabou por conquistar em 2012 o 1º prémio do concurso de fotografia organizado pela CM de Vila Nova da Barquinha. Hoje, em jeito de resposta ao nosso desafio, retrata-nos de forma fiel o que Eduardo Esteves havia feito há meio século.

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MURO DO BARULHO

Espaço de reuniões informais e entusiastas. Nos anos quarenta e cinquenta, era bastante procurado para as conversas de final de dia e de noite. Sem luz, à época, as discussões, muitas vezes acesas e de peito feito, eram escutadas por todos os que viviam nas casas em redor. As características físicas do local eram propícias para fazer ampliar as vozes, fazendo ecoar pela noite tão inflamadas quanto, por vezes, importantes discussões. Assim se batizou o muro dos encontros de ‘Muro do Barulho’. Ali se tomaram, quantas vezes, significativas decisões que diziam respeito às vidas comunitárias.

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CAMPO DE JOGOS COMENDADOR EDUARDO DUARTE FERREIRA

Fundado a 1 de maio de 1922, o Tramagal Sport União (TSU) está ligado umbilicalmente à família Duarte Ferreira. O campo de jogos, batizado de Comendador Eduardo Duarte Ferreira, assim o atesta. E está ligado também, de forma indelével, ao percurso da Metalúrgica Duarte Ferreira. O seu símbolo, uma borboleta, assim o comprova. Nos tempos áureos da vila metalúrgica, que chegou a dar trabalho a mais de duas mil famílias da região e do país, o TSU respirava o sucesso da fábrica mãe. Quem trabalhasse na fábrica, condição que não gerava grandes discussões, era ao mesmo tempo sócio do Tramagal Sport União. Aos domingos à tarde, eram grandes as romarias ao parque de jogos, nas épocas em que o TSU defrontava as principais equipas dos campeonatos nacionais. Era a festa do desporto, numa época em que os domingos à tarde estavam reservados para ‘ir à bola’ e incentivar os onze jogadores vestidos da “cor do céu’.

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IN: CARDOSO, Ana Paredes [et al.] – Tramagal: sinais do tempo. Zahara. Abrantes: Centro de Estudos de História Local. ISSN 1645-6149. Ano 10. Nº 20 (2012), p. 32-35