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POR J. CANDEIAS SILVA - Membro da Academia Portuguesa da História e do CEHLA.

É um dos edifícios públicos mais conhecidos e emblemáticos de Abrantes, pois já serviu (e serve ainda) diversos fins, alguns porventura esquecidos ou ignorados dos mais jovens. E por isso importará reavivar a memória, pela história que a casa já carrega.

De quem e de quando lhe advém o nome Carneiro?

Provavelmente do apelido do seu edificador ou antigo dono - responder-nos-ão alguns de imediato. Mas quantos, mesmo daqueles que ali estudaram ou lecionaram (e tantos foram!), saberão que este foi ao tempo uma ilustre personalidade do meio abrantino?

A pretexto de aqui sediar a Zahara e a Associação “Palha de Abrantes”, que a edita, tentámos hoje entreabrir a cortina de esquecimento que tolda o personagem e folhear um pouco este “livro aberto” do nosso património local.

JACINTO CARNEIRO: O HOMEM E O MILITAR

Jacinto Carneiro e Silva, de seu nome completo, era filho de António José Carneiro e Silva (1837- -1896) e de D. Balbina Emília. Nasceu longe, no grande país irmão, mais concretamente em Santana de Campinas (Pará, Brasil), a 12.8.1866; mas deveria ter raízes nortenhas, na zona de Santo Tirso, pois aí detinha valiosos bens rústicos e família. Pouco sabemos dos seus verdes anos. Vamos encontrá-lo em 1883-84 em Coimbra, a frequentar a Faculdade de Matemática, já órfão de mãe. O seu domicílio oficial era, porém, na freguesia de Cedofeita (Porto) e a profissão... estudante. A caminho das vinte primaveras, tinha 1 m e 60 de altura, olhos azuis, cabelos louros e barba da mesma cor, rosto oval, tez clara.

Talvez porque não nadasse em fortuna, e pretendendo abraçar uma carreira com pergaminhos, optou por se alistar como voluntário no Exército (15.10.1886), para servir por três anos num regimento de Cavalaria, ao mesmo tempo que prosseguia os estudos. E assim, em 1887, enquanto era dado como pronto para o serviço militar (16.7.1887), concluía na Universidade de Coimbra o curso preparatório para Engenharia com o grau de bacharel, e pouco depois matriculava-se na Escola do Exército (22.10.1887), aí vindo a alcançar o almejado curso de Engenharia Militar em 1891. É então promovido a Alferes para o Regimento de Engenharia (pelo Decreto de 26.11.1891), pouco depois a Tenente (Dec.° de 14.12.1893), para logo a seguir passar ao Estado-Maior de Engenharia (por ordem do Exército de 20.1.1894). Pela folha de serviços, vemos que os seus superiores lhe reconheciam qualidades: «É oficial inteligente, sério e honesto; tem boas qualidades morais; desempenha bem os serviços de que é encarregado, porém não possui bastante desembaraço» — especificava um relatório de 1897.

Porquê aquela pequena nota destoante? Começara a revelar problemas de saúde, ainda em 1896. Um relatório médico de 16.3.1898 atesta que sofria de vários achaques, designadamente de reumatismo muscular que lhe afetava várias regiões do corpo, pelo que ajunta hospitalar a deu temporariamente por incapaz. E é nesse sentido que requer residência por um mês em Santo Tirso (6.8.1898), por carecer de tomar banhos sulfurosos para minorar os seus padecimentos. Outro relatório médico (de 1900) confirma que, além do reumatismo muscular, sofria de litíase renal, o que lhe originava cólicas nefríticas.

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 Mas não lhe bastava a falta de saúde. Em setembro de 1896 morre-lhe o pai e num curto espaço de dois meses faleceram-lhe mais um irmão e um cunhado, deixando a casa paterna desolada e tendo de proceder a inventários judiciais por tais óbitos. Entretanto já Abrantes se lhe atravessara no caminho... As fontes militares não o revelam com clareza, mas por força da Inspeção de Engenharia por aqui aportara um dia e por aqui se relacionou com uma senhora abrantina, D. Maria Alexandrina Pacheco d’Almeida. Quem era e como se entrosava esta relação?

 Nascida em 1865, era filha de Luís de Almeida Júnior (1820-1894) e de Maria do Rosário Pacheco, naturais desta então vila (fregª de S. Vicente) e familiares de reputadas figuras desse tempo, como o Dr. Zeferino Pacheco (1801-1869), médico e político (presidente da CMA em 1846), ou o oficial do Exército Luís Cândido da Natividade Mena (1850- 1894), casado com D. Alexandrina Falcão Pacheco. Tinha uma irmã mais velha, Maria Cândida Pacheco d’Almeida (1862-1951), já casada com Tiago Hipólito Solano de Abreu (1862-1939), irmão do multifacetado e omnipresente Dr. Francisco Eduardo Solano Abreu (1858-1941), e ambos filhos do médico, proprietário e também político influente, Dr. Francisco Rodrigues de Abreu (1819-1888). O tenente engenheiro Carneiro e Silva, conforme ao então preceituado, requereu ao rei (D. Carlos) para contrair matrimónio. As autoridades da freguesia testemunharam o bom comportamento moral, civil e religioso da noiva. Por fim, a autorização régia chegou, a 18.9.1897, e o consórcio realizou-se a 19 de novembro de 1897, numa capela que os cunhados Tiago de Abreu e D. Maria Cândida possuíam na «magnífica e pitoresca Quinta das Sentieiras» (penso que seria aquela onde hoje se encontra instalado o “Projeto Homem”), tendo os mesmos cunhados apadrinhado os noivos.

A partir daí, embora as exigências das suas qualificadas funções o obrigassem a uma constante mobilidade no âmbito da grande circunscrição militar do Centro, da Inspeção de Engenharia, o vínculo a Abrantes estava firmado. Muito provavelmente será dessa época que datam os trabalhos de edificação do chalet que adotaria o seu nome. E, como residência sua oficial, sempre que possível procuraria fixar-se nela.

 Qual então o seu percurso a partir de então?

A documentação disponível não é abundante. Mas, aqui ficam alguns traços do que me foi possível rastrear.

- Março de 1898 - Aquando das eleições na Sociedade “João de Deus”, surge como vice- -presidente da Assembleia-Geral, ao lado do vigário e reputado jurista Dr. Manuel Martins.

- 14.11.1899 - Por motivo de doença e após requerimento, é autorizado a residir permanentemente em Abrantes, o que lhe deve ter proporcionado também uma aproximação maior às instituições locais, designadamente à Misericórdia e ao Montepio.

- Junho de 1900 - O Jornal de Abrantes cita-o na sua “Carteira”, como “estimado assinante”, a propósito de algumas deslocações com a esposa a Santo Tirso, onde detinha interesses patrimoniais.

- 27.7.1901 - Passa à situação de “adido” ao respetivo Quadro de Engenharia, por lhe ter sido concedida licença ilimitada.

-25.9.1902 - É promovido a Capitão.

- 1.1.1903 - Dada a sua boa folha de serviços, é agraciado com a condecoração de cavaleiro da Real Ordem Militar de S. Bento de Avis. «É estudioso, inteligente, ativo e zeloso no cumprimento de todos os seus deveres, sendo também um bom chefe de família, comportamento militar e civil exemplar» - revela um relatório dessa altura.

-1904/1905 - Era então subinspetor ou adjunto da Inspeção de Engenharia da 5.a Divisão Militar, tendo a seu cargo a 4.a Secção, que compreendia Abrantes, Torres Novas e Santarém, sede em Tancos (provisoriamente em Abrantes). Tinha mais sob seu encargo as obras de Abrantes, da Escola Prática de Artilharia e do Regimento de Infantaria n.º 24.

- 6.7.1906 - Por ter sido requisitado para desempenhar uma comissão de serviço dependente do Ministério do Reino [administrador do concelho de Abrantes], passa de novo à situação de adido.

- 8.3.1907 - Terminadas as funções, pede licença ilimitada, que lhe é de imediato concedida, para se ocupar de trabalhos particulares de Engenharia. No final do ano, porém, voltaria a aceitar o exercício de funções políticas, de que falaremos mais adiante. Entretanto, em janeiro de 1907, tornara- -se também vice-presidente da Assembleia-Geral do Sindicato Agrícola de Abrantes, fundado em 1905 pelo dr. Solano de Abreu [os Carneiro detinham o Casal da Sanguinheira, na Bemposta].

- 1909/1910 - Volta a desempenhar funções na Inspeção de Engenharia, chefiando a 2.a Secção. Mas uma informação datada de 15.2.1911 revela que o seu estado de saúde não só piorara como o impedia de prosseguir e ascender na carreira: «É oficial muito ilustrado e conhecedor de todos os ramos de serviço da Arma de Engenharia. (...). Tem manifestado excessiva atividade, muita competência, zelo e inteligência no cumprimento dos seus deveres profissionais, e também muito cuidado na conservação da sua dignidade pessoal, profissional e militar. É para lamentar que uma pertinaz doença tenha afastado tão prestimoso oficial do serviço da Inspeção, onde revelou muita capacidade para o serviço técnico e muita dedicação.»         

-23.2.1911 - Por ter sido julgado incapaz do serviço, temporariamente, pela Junta Hospitalar de inspeção (sofria de neurastenia e carecia de tratamento demorado), é colocado na situação de inatividade temporária; após negociação, é-lhe reconhecido, todavia, direito de posse ao cavalo de que se achava provido e que pertencia à inspeção de Engenharia.

- 21.4.1911 - O Conselho de Promoções decide que ele não poderia ser promovido [a major] sem parecer favorável de uma junta hospitalar.

- 31.8.1912 - Um despacho ministerial passa-o à reforma no posto de Capitão, com um soldo mensal de 44$000, por ter sido julgado incapaz de todo o serviço.

- 7.3.1913 - A conselho médico, pede para residir em França e na Suíça, para se tratar.... Vai frequentando também algumas estâncias termais nortenhas (p. ex., Pedras Salgadas).

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Edifício Carneiro Vista a partir dos Quinchosos.

Viria a falecer a 18.1.1922, na sua Quinta de Sande, na freguesia de Landim, concelho de Vila Nova de Famalicão [segundo outra fonte, na freguesia de Areias, concelho de Santo Tirso]. A Câmara de Abrantes, em sua sessão de 23.1.1922, aprovou um voto de pesar pelo seu passamento, acrescido de algumas considerações alusivas às boas qualidades do extinto, e deliberou fazer-se representar no funeral, que teve lugar nesse mesmo dia, tendo a urna com os seus restos mortais vindo de comboio para a estação de Abrantes e dado entrada pelas 17 horas no jazigo da família de Luiz de Almeida Júnior, seu sogro, no cemitério municipal.

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Aí se encontra ainda, estando o local bem assinalado na rua principal, à esquerda de quem entra. Contava 54 anos. Em sua memória se celebraram depois, nesta cidade, diversos atos de sufrágio e teve lugar uma homenagem pública na sala do Montepio Abrantino, a 18 de fevereiro, iniciativa de que foi principal impulsionador António Apolinário Ferreira e Silva, seu bom amigo. Na oportunidade, a viúva do ilustre finado ofertaria ao Montepio uma esmola de 100 mil réis e a mesma quantia à Misericórdia, generosidade que as instituições contempladas muito agradeceram.

JACINTO CARNEIRO: O TÉCNICO E O POLÍTICO

Do que fica dito, talvez não seja fácil dissociar o Militar do Engenheiro, pois as duas funções se entrecruzaram permanentemente e, ao tempo, era mesmo recorrente tal prática. Os grandes engenheiros eram militares. Consta também que o Eng.° Jacinto Carneiro era um Capitão fortemente imbuído das normas do RDM: era um disciplinado e um disciplinador. Seria mesmo um “duro”, como hoje diríamos, que raramente se ria e que não era de muitas falas. «É com dificuldade que estende a mão ao seu semelhante» - zurzia o Echo do Tejo de 15.7.1906, perante a perspetiva da sua nomeação para administrador do concelho.

Não obstante, há que sublinhar que esse seu carácter, que hoje diríamos pouco simpático, para a mentalidade da época era bastante apreciado por muitos, e sobretudo respeitado. E parece-me que era também assim que Jacinto Carneiro era visto pela maioria dos abrantinos: um Homem sério, enérgico e com autoridade (sem ser autoritário), que além do mais se fazia respeitar pela competência técnica. E essa competência também ele a podia colocar ao serviço da comunidade: por isso também podia dar um bom político...

Pois bem, Jacinto Carneiro, apesar de minado por uma arreliadora doença e de alinhar por cartilhas bastante conservadoras, tinha um claro sentido da “res publica”, e como tal procurou ser útil à sua terra de adoção, à sua “polis”. Primeiramente, como técnico: para além das obras referidas atrás e das inúmeras que planeou e seguiu, por fazerem parte das suas atribuições, fez o acompanhamento de muitas obras municipais, entre elas, em 1904, o edifício das repartições públicas (hoje ESTA); depois, como cidadão e político local.

Esta segunda vertente merece-nos referência um pouco mais alongada. A sua ascensão política parece relacionar-se com a do líder e fundador do Partido Regenerador Liberal, João Franco, que num período de crise profunda defendia um poder forte e reformador, uma messiânica “vida nova” contra o “arbítrio dos partidos”, adentro do constitucionalismo monárquico. Franco começou a formar Governo a 17 de maio de 1906 e tinha em Abrantes alguma clientela partidária.

 O capitão Jacinto Carneiro é nomeado Administrador do Concelho a 16 de julho de 1906. Sucedia no cargo a duas figuras políticas de peso, Raimundo José Soares Mendes e a Manuel Ferreira da Mota Ferraz, que exerceram por períodos muito curtos e conturbados. Tinha como administrador substituto António Apolinário Ferreira da Silva, com quem tinha afinidades familiares (era cunhado do Dr. Solano de Abreu) e moravam na mesma rua. (António Apolinário viria efetivamente a substituí-lo no cargo a 6.3.1907).

 Não teve um mandato fácil. Os seus alvitres, os melhoramentos que preconizava tanto para a vila como para as freguesias rurais depararam frequentemente com a oposição do presidente (Dr. António Bairrão), com quem algumas vezes teve desaguisados. Para a sua saída poderá ter contribuído a atitude complacente que teve com os líderes nacionais do PRP aquando do famoso Comício Republicano, realizado na Praça de Touros a 3.2.1907. No entanto, por este caso foi então bastante elogiado, em especial por Brito Camacho, que ressaltaria o facto de o Administrador ter dado instruções aos agentes da ordem para não exercerem no local funções repressivas (cf. A Lucta, de 5.2.1907).

 Mas a posição política mais elevada a que ascendeu seria mesmo a de presidente da Câmara Municipal de Abrantes, pelo partido regenerador- -liberal (franquista). Tomou posse do cargo a 2.1.1908, tendo como principais colaboradores o Ten. Coronel reformado Vicente Temudo de Oliveira Mendonça (como vice-presidente -11909) e Tiago Hipólito Solano de Abreu (como vogal efetivo). 

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 Ten. Coronel Vicente Temudo de Oliveira Mendonça.                                           Tiago Hipólito Solano de Abreu

 

Como administrador do concelho, tinha outro grande amigo, António Apolinário da Silva Oleiro, antigo tesoureiro da Fazenda Pública (tl926).

No discurso da tomada de posse, dizendo interpretar o sentir da sua equipa, afirma que a mesma tinha «o mais vivo desejo de ser útil ao município», que «orientará a sua administração pelos princípios da moralidade, justiça e economia bem entendida» (...) e que, empregando «os seus melhores esforços», «procurará estudar as questões que interessam ao bem estar e progresso quer das freguesias rurais quer da vila, e dar-lhes resolução com decidida boa vontade, dentro dos recursos orçamentais». E, de facto, logo numa das primeiras sessões, apresenta uma série de propostas interessantes, de planeamento e gestão urbana (Ver o Doc. 1 dos Anexos).

 Contudo, um acontecimento de grande impacto nacional - o Regicídio (ocorrido a 1 de fevereiro de 1908, com a consequente queda de João Franco) - viria alterar radicalmente todos os planos; e de nada valeram os votos de protesto pelos crimes cometidos e os telegramas de pesar e lealdade aprovados em câmara. Foi, assim, um mandato de curtíssima duração, acabando o executivo por ser exonerado e substituído, a 19.2.1908, por um outro presidido pelo Dr. António Ferreira Bairrão, seu adversário regenerador, embora também só por alguns meses...

A CASA-PALACETE CARNEIRO

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Foi esta erigida num espaço altamente cotado, por ser contíguo ao Jardim do Castelo, onde o sogro (Luís de Almeida), que era proprietário e negociante, detinha um armazém. Este prédio já vem bem identificado numa planta da Abrantes de 1817, mas não com o formato atual. Herdou-o a filha Maria Alexandrina, pouco antes do casamento com Jacinto Carneiro: confrontava a poente com prédio de Jacinto de Sousa Falcão e a Norte com a Rua de S. Pedro ou dos Coelheiros (descrição num título do DG de 7.10.1896 - escritura lavrada nas notas do tabelião de Abrantes, Francisco Egydio Salgueiro). Por certo que foi reedificado na sua quase totalidade e a expensas da esposa, a partir de valores provenientes da herança paterna (naturalmente com o apoio do marido e como cortesia deste à mulher), porque ela declararia o imóvel sempre como «bem próprio, separado da comunhão, com inteira separação de bens e dos que de futuro adquirisse» ...

Quando foi construído? Penso que após o enlace matrimonial, na viragem do século - há fotos dele, acabado, de 1903. É de planta longitudinal, de dois pisos (que chegam a ser três no pano da cota inferior aproveitando o declive do terreno, contando ainda com um enorme sótão, que na prática pode funcionar como 3.°/4° piso); apresenta três panos, todos delimitados por pilastras de calcário, segundo um eixo de simetria, mas com uma interessante particularidade arquitetónica: enquanto na fachada principal (norte) os dois panos laterais terminam em vértice, na fachada oposta, porventura a mais interessante é o central que culmina em vértice. A entrada principal é também pela Rua de S. Pedro e faz-se através de uma pequena escadaria, de nove degraus, com guardas laterais.

Quanto ao interior, igualmente de grande dignidade, distinguem-se nele: no lº piso - o átrio principal com escadaria em Y de acesso ao 2.° registo e de onde divergem corredores para várias salas, tendo logo à esquerda aquela que era a sala- oratório, bem identificada no teto estucado pelos símbolos religiosos da eucaristia (cordeiro pascal e ostensório com espigas de trigo em aspa), e à direita a sala de trabalho e biblioteca, do mesmo modo bem assinalada nos estuques do teto com os instrumentos do ofício (globo, canudo, livros, rolos de papel, compasso, transferidor, paleta e pincéis, martelo e formão, etc); no 2.° piso - a área domiciliária por excelência, com um grande salão a dar para a rua, magnificamente estucado e pavimentado, sala de jantar também com belos estuques e lareira abrindo para um terraço, enorme cozinha, quartos vários e salas de outras funções também com lareira.

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Em síntese, é uma moradia (ou chalet como então se designava) de prestígio, com uma gramática de boa erudição, manifesta sobretudo pelo grande sentido de proporcionalidade, harmonia geral e por uma conceção fora do comum para Abrantes. Destaque para a verticalidade das linhas, a regularidade dos vãos, 3 o cromatismo e os materiais utilizados; se bem que possamos ver no conjunto um gosto discutível, contrastando por um lado a elevada craveira técnica do autor, mas por outro uma forte disciplina e alguma austeridade, manifesta no sentido algo pesado da volumetria, claramente excessiva para aquele enquadramento. Era ao tempo, e continua a ser, um dos edifícios que mais se destacavam na malha urbana, distinguindo-se bem ao longe...

Não sei bem onde possa ter-se inspirado o seu autor. Salvaguardando as diferenças e a finalidade bem diversa, parece denotar alguma relação com o edifício das Repartições Públicas (hoje ocupado pela ESTA). Com aquela arquitetura, veio Jacinto Carneiro a demonstrar a sua visão pragmática e utilitária. Era um prático, “à romana” ... Dificilmente ele quereria para si uma casa romântica, ao estilo da de Solano de Abreu no Vale de Roubam. E, no entanto, podia ter sido influenciado por ela, pois esta (do V de Roubam) foi construída entre 1892-1895 e foi decorada por artistas seus conhecidos (Joaquim do Couto Abreu e Serra da Mota). Aliás, eles eram todos amigos (e até aparentados), tendo participado todos em 1898 na festa de inauguração da capela da “Vila Maria Amélia”.

Relativamente à Casa Carneiro, falecido o Capitão-engenheiro, ela continuou a ser a residência da mulher (D. Maria Alexandrina Carneiro) até ao fim dos seus dias, pois não deixaram geração. Há quem ainda se lembre bem da senhora, de a ver por lá com uma sua criada... De resto, tinha ainda sobreviva a irmã, D. Maria Cândida, também viúva a partir de 1939. Esta veio a falecer a 20 12.1951, na Rua Grande (casa onde nasceram os Solano de Abreu), com 89 anos, indo repousar no jazigo de seus pais e deixando por herdeiras duas filhas, Maria Emília e Maria Alexandrina Abreu (V Doc. 3).

Poderíamos admitir que, pelas suas dimensões, o palacete necessitasse por vezes de certas obras de conservação e restauro. Mas, processos em nome da proprietária, na Câmara Municipal, apenas entrou um, em 1938, a pedir licença para restauro de uma sua outra casa na Rua António Maria Baptista, hoje D. Miguel de Almeida, nºs 19-21 (que depois foi a “Pensão Abrantes”)... Finalmente, foi a 20.10.1953, na sua casa da Rua de S. Pedro, que deixou o mundo dos vivos a viúva de Jacinto Carneiro e Silva, contando 88 anos, indo também repousar no mesmo jazigo de família (dos pais, do marido e da irmã). Por herdeiros legítimos, ficaram as duas sobrinhas atrás citadas. A elas coube a propriedade e o destino da Casa que nos ocupa.

 O edifício foi comprado pela CMA em 1955 (executivo então presidido pelo major Manuel Machado), com vista a instalar nele os serviços escolares da Escola Industrial e Comercial, tendo as intensas negociações decorrido ao longo do mês de fevereiro. Finalmente, a 25.2.1955, considerando as duas herdeiras o fim imediato a que a Câmara destinava a Casa, «com espírito de compreensão e boa vontade» e reconhecendo as deficientes condições em que funcionava a EICA na Rua Grande, concordaram no preço proposto: 460 000$00.                                                                 Compunha-se a Casa, conforme a Ata da reunião ordinária da CMA de 28.2.1955 e a escritura notarial lavrada a 31.7.1956, de uma morada de casas de habitação abrangendo os nºs de polícia 26 a 32, tendo no rés-do-chão 10 divisões, no lº andar 8 e no 2.° andar 10 divisões, com dependências e logradouro, com a área de 346 m2 (as casas) + 45 m2 (as dependências) + 800 m2 (o quintal ou logradouro), possuindo as casas um total de 64 vãos.

SERVIÇOS QUE POR AQUI PASSARAM

- EICA - A funcionar em instalações precárias num velho edifício da Rua Grande/Santos e Silva (onde começara em 5.11.1953), crescia a um ritmo vertiginoso, passando de 237 alunos e 9 turmas nesse ano primeiro letivo para 332 alunos e 15 turmas no ano seguinte.... pelo que algumas destas se transferiram ainda em abril de 1955 para o Edifício Carneiro. Aí se manteve a Escola até 1959, ano em que ficou concluído o novo edifício escolar (atual Escola Secundária Solano de Abreu), dado por acabado em maio desse ano. Foi no Edifício Carneiro que, no ano de 1957-58, se formaram os lºs alunos finalistas dos cursos de Comércio e Formação Feminina, mais os do Curso de Formação de Serralheiro. Em 1958-59 frequentavam já a Escola, nos seus diversos cursos, 913 Alunos em 36 Turmas...

- Secção de Abrantes do Liceu Nacional de Santarém - Criada por despacho ministerial de 26.7.1967, foi inaugurada a 2.10.1967, pelo então Diretor-geral do Ensino Liceal, em representação do M.E.N., contando com 106 alunos, 4 professores e 3 funcionários, tendo por vice-reitor o Dr. João Pequito. A secção foi depois promovida a Liceu Nacional de Abrantes (1973?), aí funcionando até ao final do ano letivo de 1974-75, já a rebentar pelas costuras. A saída deu-se em Set.°/Out. 1975, para as antigas instalações do Colégio La Salle, onde ainda se mantém como Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes (por algum tempo também designada Escola Secundária nº 2 de Abrantes).

- Delegação do IPJ (Instituto Português da Juventude) e alguns serviços socioculturais da CMA - Centro de Saúde de Abrantes - de 1984 até 26.4.1994, data esta em que se transferiu para o novo edifício do Hospital Distrital.

- Núcleo de Abrantes da Cruz Vermelha Portuguesa - Este CVP-US inaugurou as suas instalações neste edifício a 10.12.1983, sendo de momento a instituição há mais tempo aqui instalada.

- Universidade Internacional - O seu início de funcionamento foi em outubro de 1994, com inauguração solene e oficial das instalações a 18.3.1995, depois de ter funcionado por alguns anos no Convento de S. Domingos (desde 1990). Persistiu aqui como Centro de Apoio da UI-SIPEC, já em fase de desagregação, até 2002.

- UTIA - Universidade da Terceira Idade de Abrantes...

E HOJE?

Funcionam no edifício diversas instituições e serviços: Para além do Núcleo da Cruz Vermelha (já atrás referido), o Abranpolis (desde Outubro de 2002), a Escola de Música do Orfeão de Abrantes, a Cres.cer (Associação de Desenvolvimento Pessoal e Comunitário)... até à nossa Palha de Abrantes (sede da Zahara).

Por tudo isto, penso não restarem dúvidas que esta seja uma Casa já “com história” e merecedora de passar a fazer parte dos nossos roteiros de Património.

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Apêndice documental

Doc. 1 - Conjunto de propostas de planeamento urbano apresentadas a 22.1.1908 pelo Presidente da Câmara de Abrantes, Jacinto Carneiro e Silva (Arquivo Histórico de Abrantes, Livro de Atas da CMA dos anos 1907-1908, fl. 53 e segs.)

 O Ex.mo presidente apresentou as seguintes propostas:

1. Que se resolva fazer aquisição de livros criteriosamente escolhidos, destinados a uma biblioteca municipal, que deverá instalar-se dentro de alguns anos e logo que a quantidade de livros adquiridos o permita, se nesta orientação se mantiverem - como é de esperar - as futuras vereações.

 2. Que se proceda à arborização dos ramais de entrada na vila e outros recintos da mesma, tratando-se destes trabalhos ainda no princípio do corrente ano, se o curto tempo disponível ainda para plantações o permitir, ou no fim do ano, em caso contrário.

 3. Que, como indispensável ao saneamento e limpeza da vila, se proceda à construção de retretes públicas.

 4. Que se proceda ao alargamento do atual mercado de gados, solicitando-se para esse fim do Ministério da Guerra, a concessão do terreno ocupado pelas muralhas e fossos de Santo António.

5. Que à escola de instrução secundária, subsidiada pela Câmara, se dedique toda a atenção, promovendo- -se tanto quanto possível for, que ela abranja o ensino da 4.a e 5.a classes.

 6. Que se proceda à iluminação da povoação de Rio de Moinhos, como há muito é reclamado e bem se justifica, pela importância e situação da mesma povoação, que é atravessada por uma estrada de grande concorrência e é atingida pelas cheias do Tejo.

7. Que seja criado um partido médico com sede na freguesia de Alvega e com a dotação anual de 350$000 réis. (...).

Todas estas propostas foram aprovadas por unanimidade.

Pelo Ex.° presidente foi apresentado o orçamento ordinário para o corrente ano, resolvendo-se que fosse exposto ao público nos termos do artº 91 do Código Administrativo.

Disse a seguir o Ex.° presidente que, além dos melhoramentos a que se referira, e dos que se acham indicados no orçamento, outros, que muito se prendem com o futuro da vila e do concelho, cumpria à Comissão estudar. Sobreleva em importância o do alargamento da vila, pela criação de um novo bairro para onde possa expandir-se a iniciativa particular e no qual venham a executar-se futuras construções, quer do Município quer do Estado. Todos sabem como as construções se acham atualmente aglomeradas e como, dentro do recinto das antigas muralhas em que a vila se tem encerrado, não há já espaço para edificações. Ainda há poucos anos, por falta de terreno, foi construída uma escola oficial num dos largos da vila, em que ela aliás tão parca é! Propõe, portanto, que a Comissão estude refletidamente o problema do alargamento da vila. Do exame da sua planta vê-se que para esse fim está naturalmente indicado o terreno compreendido pelo ramal do Chafariz - Santo António e os quintais da Rua do Paço Real, Santa Iria, etc., que mede proximamente 1/5 da superfície atual da vila. Outras soluções teria o problema, e entre elas cita a de se prolongar a rua da Praça do Príncipe Real [hoje Jardim da República] na direção da rua do Cabo, ligando-a por um lado ao Ramal para o Tejo e por outro à Rua da Barca e estabelecendo-se um novo bairro na vertente voltada para o Tejo, de modo a fazer-se a ligação da vila com as Barreiras do Tejo, Hortas, etc. Proporcionaria esta solução uma melhor entrada na vila, como tanto é de desejar, mas opõe-se-lhe uma dificuldade insuperável, — a remoção do cemitério para outro local. Além de que - e sem aludir a razões de natureza higiénica - seria este novo bairro totalmente excêntrico à atual vila e por isso menos adequado a algumas construções a que é mister proceder com relativa urgência. Esta solução, digna aliás de registo, não deve ser, portanto, a primeira a adotar; um futuro mais remoto por certo a espera. Para o estudo do terreno a que se referiu e que muito recomendado se torna ainda pela sua magnífica exposição sul, chama, pois, a atenção da Comissão. Dum modo geral, parece-lhe que, como início do novo bairro, se deveria abrir uma avenida ligando o ramal Chafariz - Santo António com a embocadura das ruas José Estêvão e Paço Real, e duas ruas secundárias, ligando aquela avenida por um lado à rua do Chafariz e por outro ao ramal de Sant’Ana. A ligação da avenida com a embocadura das ruas referidas deverá fazer-se por meio dum largo suficientemente amplo. A abertura de novas ruas secundárias ficará dependente do desenvolvimento que as construções particulares forem tomando. À entrada da avenida deveria ser reservado terreno para a construção d’um mercado. Propõe que deste estudo, assim orientado, seja encarregado o distinto engenheiro Joaquim Maria Valente. O orçamento da obra indicará a maneira prática de ser levado a efeito. Evidentemente, exige ela um esforço continuado durante um certo número d’anos; mas basta atender a que se visa alargar a vila d’um quinto da sua atual área para se reconhecer que nunca será para isso demasiado o prazo de 9,12 ou mais anos ainda. E, se a Comissão na sua transitória passagem pela administração do município conseguir deixar de tão importante melhoramento um projeto refletidamente estudado, detalhado e orçado, e indicar ao mesmo tempo o modo prático de ser executado por períodos anuais e dentro dos recursos ordinários do município, terá - na opinião dele, presidente - desempenhado um dos seus mais gratos encargos. Esta proposta foi aprovada por unanimidade.

Doc. 2 - Testamento de Jacinto Carneiro, lavrado em Abrantes a 4.9.1912 e apresentado ao notário da comarca, Henrique de Miranda Martins de Carvalho, perante testemunhas, contendo uma página e 28 linhas. Notar a ausência de referências concretas à Casa-palacete da Rua de S. Pedro, por o edifício se encontrar já em nome da esposa e ser considerado bem próprio dela (Arquivo Histórico de Abrantes)

 Eu abaixo assinado, Jacinto Carneiro e Silva, capitão de Engenharia, morador em Abrantes, faço por esta forma o meu testamento: Deixo o usufruto da minha Quinta de Sande, constituída por todos os prédios que possuo nas freguesias de Landim e Ávidos, do concelho de Vila Nova de Famalicão, do distrito de Braga, e na freguesia de Palmeira, do concelho de Santo Tirso, do distrito do Porto, em primeiro lugar a minha mulher Maria Alexandrina Pacheco d’Almeida Carneiro e Silva; por morte da minha referida mulher passará esse usufruto para minha irmã Maria Balbina Geraldes de Mesquita, viúva de Augusto Geraldes de Mesquita1. Deixo a propriedade da mencionada Quinta de Sande a minha sobrinha Maria Emília de Mesquita Ramalho, casada com João da Costa Ramalho, com a obrigação de pagar anualmente a seu irmão Augusto Geraldes de Mesquita [Júnior], enquanto este vivo for, a quantia de quatrocentos mil reis no fim de cada ano que for decorrendo depois de, por morte das referidas usufrutuárias, ter a minha aludida sobrinha entrado no gozo da propriedade plena da mesma Quinta. Instituo por única e universal herdeira de todos os bens, direitos e ações que me pertencerem e existirem na ocasião do meu falecimento, incluindo todo o mobiliário, roupas e louças, gados, vasilhame, máquinas, instrumentos e alfaias agrícolas que eu possua na referida Quinta de Sande e que não fazem parte do legado deixado a minha sobrinha Maria Emília de Mesquita Ramalho, a minha mulher Maria Alexandrina Pacheco d’Almeida Carneiro e Silva, a quem também nomeio testamenteiro. Abrantes, quatro de setembro de mil novecentos e doze. a) Jacinto Carneiro e Silva

Doc. 3 - Escritura da compra que fez a Câmara de Abrantes às duas herdeiras de D. Maria Alexandrina Pacheco d’Almeida Carneiro e Silva (filhas de sua irmã D. Maria Cândida Pacheco d’Almeida e de Tiago Hipólito Solano de Abreu), de uma casa de habitação e quintal, na Rua de S. Pedro, pela quantia de 460 000$00 (Resumo) - 31.7.1955 (Arquivo Histórico de Abrantes)

Aos trinta e um dias do mês de Julho de mil novecentos e cinquenta e seis, nesta cidade de Abrantes e na Secretaria da Câmara Municipal, na rua José Estevam, número oito, perante mim Isidro Sequeira Estrela, chefe da Secretaria e exercendo, nos termos da lei, funções notariais, e as testemunhas idóneas ao diante nomeadas e assinadas, compareceram como outorgantes: Primeiro - O Senhor major Luiz Gastâo Ramalho Fernandes, casado, oficial do Grupo de Artilharia Contra Aeronaves nº 2, desta cidade, na qualidade de bastante procurador das senhoras D. Maria Emília Pacheco de Almeida Abreu Mena, viúva, proprietária, moradora nesta cidade, e D. Maria Alexandrina Abreu da Costa de Sousa de Macedo, casada (...) com Luiz da Costa de Sousa / de Macedo, proprietária (...); Segundo - O Senhor major Manuel Machado, casado, morador nesta cidade na rua Marquês de Pombal, (...) na qualidade de Presidente da Câmara Municipal, outorgando por esta, devidamente autorizado por deliberação tomada em reunião de vinte e oito de Fevereiro de mil novecentos e cinquenta e cinco, como me provou e fez certo pela certidão da correspondente parte da respetiva ata (...). Pelo primeiro outorgante foi dito, na qualidade que representa, que as suas representadas são donas e legítimas possuidoras: - de uma morada de casas de habitação que se compõe de rés-do-chão, com dez divisões, primeiro andar com oito divisões, segundo andar com dez divisões, com dependências e logradouro, com a área, as casas de 346 m2, dependências com 45 m2, logradouro com 800 m2, com 64 vãos, situada na Rua de S. Pedro, com os nºs de polícia 26, 28, 30 e 32, e que confronta pelo Norte com Jardim Público, Poente com a Rua de S. Pedro (...); de um terreno de semeadura de sequeiro com árvores de fruto, denominado Tapada, sito no Castelo, freguesia de S. João, que confronta pelo Norte e Nascente com o Jardim Público, Poente com Maria Alexandrina Carneiro e Silva (...). Que pela presente escritura e de hoje para sempre, na qualidade que representa, vende ao segundo outorgante os prédios atrás descritos e confrontados, todas as suas pertenças e livre, como se encontra, de todo e qualquer ónus, encargo ou responsabilidade, pela quantia de quatrocentos e sessenta mil escudos, da qual já recebeu a importância de quatrocentos e cinquenta e cinco mil escudos (...) Que nos termos expostos e nos demais de direito aplicável, se obrigam a fazer esta venda boa, firme e de paz a todo o tempo, aceitando a autoria e prestando a evicção. Pelo segundo outorgante foi dito foi dito, na sua qualidade de representante da Câmara Municipal de Abrantes e conforme deliberação tomada em reunião de 28 de Fevereiro de 1955, que aceita para a Câmara Municipal de Abrantes esta venda, cujos prédios se destinam a instalação de serviços públicos e ao funcionamento imediato, ainda que a título precário, da Escola Industrial e Comercial de Abrantes. Por esta compra foi pago o imposto de sisa, por negado o pedido de isenção, da quantia de 18 434$00. Seguem-se as disposições finais e assinaturas.

In: SILVA, Joaquim Candeias da – O edifício Carneiro uma casa com história. Zahara. Abrantes: Centro de Estudos de História Local. ISSN 1645-6149. Ano 5 Nº 9 (2007), p. 3-11